Acima:operações nos dois primeiros anos da guerra, com a conquista da Armênia por Córbulo Abaixo:Operações nos anos finais da guerra, quando os raides de Tigranes provocaram um contra-ataque parta que culminou na rendição dos romanos liderados por Cesênio Peto na Batalha de Randeia.
Guerra romano-parta de 58–63 foi uma guerra travada entre as forças do Império Romano e do Império Parta sobre o controle do Reino da Armênia, um estado-tampão vital entre os dois impérios. A Armênia era um estado cliente romano desde a época do imperador Augusto, mas, em 52-3, os partas conseguiram instalar seu próprio candidato no trono armênio, Tirídates.
Estes eventos coincidiram com a ascensão de Nero ao trono imperial em Roma e o jovem imperador resolveu reagir com vigor. A guerra, que foi a única grande campanha militar de seu reinado, começou com um rápido sucesso para as forças romanas, lideradas pelo habilidoso Cneu Domício Córbulo. Ele venceu as forças leais a Tirídates, instalou seu próprio candidato, Tigranes VI e partiu. Os romanos tiveram sorte, pois o xá, Vologases I, estava ocupando tentando sufocar uma revolta na Hircânia, em seu próprio império. Tão logo ele resolveu a situação por lá, os partas voltaram sua atenção para a Armênia e, depois de dois anos de campanhas inconclusivas, conseguiram infligir uma dura derrota sobre os romanos na Batalha de Randeia.
O conflito terminou logo depois num beco sem saída e numa solução de compromisso para ambas as partes: o príncipe persa, de linhagem arsácida, seria o novo rei da Armênia, mas sua nomeação deveria ser aprovada pelo imperador romano.[1] Este conflito foi o primeiro confronto direto entre partas e romanos desde a desastrosa expedição de Crasso e da campanha parta de Marco Antônio, um século antes, e seria a primeira de uma longa série de guerras entre romanos e iranianos sobre o controle da Armênia (veja Guerras romano-persas).[2]
Contexto
Desde o primeiro contato entre a República Romana e o Império Parta, em meados do século I, houve fricção entre os dois grandes poderes da época sobre o controle dos diversos estados menores que ficavam na região entre eles. O maior e mais importante deles era o Reino da Armênia. Em 20 a.C., Augusto conseguiu estabelecer um protetorado romano sobre o país, patrocinando a ascensão de Tigranes III. A influência romana foi assegurada através de uma série de reis patrocinados até 37 d.C., quando um candidato apoiado pelos partas, Orodes, assumiu o trono. O rei apoiado pelos romanos, Mitrídates, recuperou o trono com o apoio de Cláudio em 42,[3] mas foi deposto em 51 por seus sobrinho, Radamisto, da Ibéria. Seu reinado rapidamente se tornou impopular, abrindo uma oportunidade para o recém-coroado rei Vologases I intervir.[4] Suas forças rapidamente conquistaram as duas capitais da Armênia, Artaxata e Tigranocerta, e colocaram seu jovem irmão, Tirídates no trono. A chegada de um duro inverno e a irrupção de uma epidemia forçaram o recuo das tropas partas, o que deu espaço para Radamisto retomar o controle do país.[4] Seu comportamento com seus súditos, porém, tornou-se pior do que antes e a população se revoltou. Assim, em 54, Radamisto fugiu para a corte de seu pai, na Ibéria, e Tirídates foi re-estabelecido como rei da Armênia.[2][5]
No mesmo ano, em Roma, o imperador Cláudio morreu e foi sucedido por seu enteadoNero. O controle parta sobre uma área considerada como zona de influência romana preocupava a liderança imperial e era amplamente considerada como send um teste para as habilidades do novo imperador.[6] Nero reagiu com vigor, nomeando Cneu Domício Córbulo, um general que já havia se destacado na Germânia e que servia na época como governador da Ásia, o comandante supremo no oriente.[7]
Preparativos e manobras diplomáticas
Córbulo recebeu o controle sobre duas províncias, a Capadócia e a Galácia (ambas na moderna Turquia central), com autoridade propretorial e, depois, proconsular (imperium).[8] Embora a Galácia fosse considerada um bom lugar para o recrutamento de novas tropas e a Capadócia fosse capaz de fornecer algumas poucas unidades auxiliares, o grosso de seu exército veio da Síria, onde metade da guarnição de quatro legiões e diversas unidades auxiliares foi transferida para seu comando.[9]
Inicialmente, os romanos esperavam resolver a situação por meios diplomáticos: Córbulo e Umídio Quadrado, o governador da Síria, enviaram embaixadas a Vologases propondo que ele entregasse reféns, como era costumeiro nas negociações da época como forma de garantir a boa fé.[10] Vologases, preocupado com a revolta de seu filho Vardanes, que fez com que ele tivesse que retirar suas forças da Armênia, rapidamente concordou.[11] Seguiu-se então um período de inquieta inatividade, com tema da Armênia suspenso sem solução. Córbulo recolocou suas tropas em forma e as preparou para o combate depois de uma longa inatividade na pacífica fronteira do oriente.[12] Segundo Tácito, Córbulo dispensou os velhos e doentes, manteve o exército inteiro acampado em barracas durante o duro inverno do platô Anatólico para aclimatá-las às neves da Armênia e aplicou uma disciplina estrita, punindo desertores com a morte. Durante todo este período, ele teve o cuidado de dividir as agruras com seus homens, estando sempre presente entre as tropas.[13]
Neste meio tempo, Tirídates, apoiado por seu irmão, se recusou a ir a Roma e chegou a se envolver em operações contra armênios que ele considerava leais demais a Roma.[14] As tensões foram se acumulando e, finalmente, no início da primavera de 58, a guerra começou.
Início da guerra — Ofensiva romana
Córbulo havia instalado um grande número de suas tropas auxiliares em uma linha de fortes perto da fronteira armênia sob a liderança de um antigo primipilo, Pácio Órfito. Desobedecendo as ordens de Córbulo, Pácio utilizou algumas das recém-chegadas alas da cavalaria romana para realizar uma campanha contra os armênios, que pareciam despreparados. O raide falhou e as tropas recuando chegaram a espalhar o pânico entre as guarnições dos demais fortes.[15] Foi um início pouco auspicioso para uma campanha e Córbulo puniu com severidade os sobreviventes e seus comandantes.[15]
Tendo treinado com seu exército por dois anos, Córbulo, apesar do fracasso inicial, estava pronto. Ele tinha três legiões à sua disposição (III Gallica e VI Ferrata, da Síria, e a IV Scythica),[16] com numerosas unidades auxiliares e contingentes aliados de reis clientes como Aristóbulo da Armênia Menor e Pôlemon II do Ponto. A situação era, portanto, claramente favorável aos romanos: Vologases enfrentava uma séria revolta entre os hircanianos na região do mar Cáspio e incursões dos nômadesdaas e sacas da Ásia Central, o que o deixou impossibilitado de ajudar o irmão.[14]
A guerra até então não passava de uma série de escaramuças ao longo da fronteira romano-armênia. Córbulo tentou proteger os assentamentos armênios pró-romanos e, simultaneamente, retaliou contra os que apoiavam os partas. Dado que Tirídates evitava o confronto direto, Córbulo dividiu suas forças para poder atacar vários locais simultaneamente e instruiu seus aliados, os reis Antíoco IV de Comagena e Farasmanes I da Ibéria, a atacar a Armênia a partir de seus próprios territórios. Além disso, uma aliança foi firmada com os muški, uma tribo que vivia no noroeste da Armênia.[14]
Tirídates reagiu enviando emissários para perguntar por que estava sob ataque mesmo tendo fornecido os reféns. Córbulo reiterou a exigência de que ele fosse até Roma para ter sua coroa reconhecida por Nero.[14] Finalmente, os dois lados concordaram em se encontrar. Tirídates anunciou que levaria 1 000 homens ao encontro, implicando que Córbulo deveria levar a mesma quantidade "de forma pacífica, sem armaduras e elmos". Tácito sugere que Tirídates pretendia sobrepujar os romanos, pois a cavalaria parta seria muito superior a um igual número de legionários romanos em qualquer situação.[17] Seja como for, numa clara demonstração de força, Córbulo decidiu levar consigo grande parte de sua força, não apenas da VI Ferrata, mas também 3 000 homens da III Gallica e tropas auxiliares.[17] Tirídates apareceu no lugar combinado, mas, vendo os romanos totalmente preparados para o combate, desconfiou de suas intenções, afastou-se e fugiu durante a noite.[18] Tirídates então passou a utilizar a mesma tática utilizada com sucesso um século antes contra a as tropas de Marco Antônio: passou a atacar as linhas de suprimento do exército romano, que se estendiam através das montanhas até Trapezo (moderna Trabzon), na costa do mar Negro. Ele fracassou, pois os romanos tiveram o cuidado de proteger as rotas pelas montanhas com uma série de fortes.[19]
Queda de Artaxata
Córbulo então decidiu atacar diretamente as principais fortalezas de Tirídates. Elas não eram apenas instrumentais para o controle da região e fontes de receitas e soldados, mas uma ameaça a elas poderia forçar Tirídates a arriscar uma batalha direta, uma vez que, nas palavras do historiador A. Goldsworthy, "um rei que não consegui defender as comunidades leais a si [...] perdia prestígio".[20] Córbulo e seus subordinados conseguiram tomar três destes fortes, incluindo Volando,[21]"a mais poderosa de todas naquela província" segundo Tácito, em um dia e com pouquíssimas baixas, massacrando suas guarnições. Aterrorizadas com esta demonstração de poder, diversas cidades e vilas se renderam e os romanos se prepararam para marchar contra a capital setentrional da Armênia, Artaxata.[18]
Este movimento forçou Tirídates a confrontar os romanos com seu exército antes que chegassem à cidade. A força romana, reforçada por um vexillatio da X Fretensis, marchou em quadrado oco, com as legiões apoiadas por cavaleiros auxiliares e arqueiros a pé. Os soldados romanos estavam sob ordens estritas de não quebrarem a formação e, apesar dos repetidos ataques e falsos recuos pelos arqueiros montados partas, a infantaria se manteve junta até o anoitecer.[22] Durante a noite, Tirídates recuou seu exército e abandonou sua capital; seus habitantes imediatamente se renderes e receberam permissão para partir sem serem incomodados, mas a cidade foi incendiada para que importantes recursos necessários para o resto da campanha não fossem desperdiçados guardando-a.[23]
Queda de Tigranocerta
Em 59, os romanos marcharam para o sul, na direção de Tigranocerta, a segunda capital Armênia. No caminho, os homens de Córbulo puniram todos os que resistiam ou se escondiam, dispensando misericórdia apenas aos que se rendiam.[24] No duro e seco terreno do norte da Mesopotâmia, o exército sofreu com a falta de recursos, principalmente água, até chegarem nas férteis regiões próximas a Tigranocerta. Nesta época, um complô para assassinar Córbulo foi descoberto e aniquilado. Diversos nobres armênios que haviam se juntado ao acampamento romano foram implicados e executados.[25] Segundo uma história contada por Frontino, quando o exército romano chegou em Tigranocerta, a cabeça cortada de um dos conspiradores foi lançada para dentro da cidade. Por acaso, ela caiu justamente onde o conselho estava reunido; eles imediatamente decidiram render a cidade, que foi, por isso, poupada.[26] Logo depois, uma tentativa do exército parta, liderado por Vologases, de invadir a Armênia foi repelida por Verulano Severo, o comandante dos auxiliares.[27]
Toda a Armênia estava sob controle romano e eles rapidamente instalaram seu novo rei, Tigranes VI, o último descendente da casa real capadócia, em Tigranocerta. Algumas regiões limítrofes na Armênia ocidental foram cedidas aos estados clientes romanos como compensações de guerra. Córbulo deixou 1 000 legionários, três coortesauxiliares e duas alas de cavalaria (c. 3-4 000 homens) para trás para apoiar o novo monarca e se retirou com o resto do exército para a Síria, cujo governo ele assumiu (em 60) como recompensa pelo seu sucesso.[27]
Contra-ataque parta
Os romanos estavam cientes de que sua vitória era muito frágil e que, assim que o xá terminasse de lidar com a revolta na Hircânia, ele voltaria sua atenção para a situação na Armênia. Apesar da relutância de Vologases de arriscar um conflito aberto com Roma, no final ele acabou forçado a agir quando Tigranes atacou a província parta de Adiabene em 61. Os protestos furiosos de seu governador, Monobas, e suas súplicas por proteção não podiam ser ignorados por Vologases, cujo prestígio e autoridade estavam em jogo.[28] Ele rapidamente firmou um tratado com os hircânios e finalmente se viu livre para uma campanha contra Roma, para a qual convocou uma assembleia de nobres de seu império. Lá, ele reafirmou publicamente a posição de Tirídates como rei da Armênia ao coroá-lo com um diadema. Para conseguir reinstalar seu irmão no trono armênio, o xá reuniu uma força de cavalaria sob o comando de Moneses complementada por uma infantaria de Adiabene.[29]
Para enfrentá-lo, Córbulo enviou a IV Scythica e a XII Fulminata para a Armênia e espalhou as três outras legiões sob seu comando (III Gallica, VI Ferrata e XV Apollinaris) pela fronteira do rio Eufrates, pois temia que os partas pudessem invadir a Síria. Em paralelo, ele requisitou a Nero que nomeasse um legado separado para a Capadócia, com a responsabilidade de levar a guerra à própria Armênia.[30]
Cerco parta de Tigranocerta
Enquanto isso, Moneses invadiu a Armênia e se aproximou de Tigranocerta. Tigranes teve o cuidado de reunir suprimentos e a cidade estava bem fortificada e bem guarnecida por romanos e armênios. O cerco foi realizado principalmente por um contingente de Adiabene enquanto os partas, notórios cavaleiros, não sabiam e nem queriam participar de cercos.[31] O assalto parta fracassou e foi repelido com diversas baixas por uma surtida romana.[32] Neste momento, Córbulo enviou um emissário a Vologases, que estava acampado com sua corte em Nísibis, perto de Tigranocerta e da fronteira romano-parta. O cerco fracassado e a escassez de folhagem para alimentar seus cavalos forçaram Vologases a concordar com a retirada de Moneses da Armênia.[33] Os romanos também deixaram a Armênia, o que, segundo Tácito, levantou suspeitas sobre os reais motivos de Córbulo: rumores davam conta que ele havia acordado uma retirada mútua com os partas e que ele não estava disposto a arriscar sua reputação reiniciando as hostilidades.[34] Seja como for, uma trégua foi acordada e uma embaixada parta seguiu para Roma. As negociações fracassaram e a guerra recomeçou na primavera de 62.[35]
Neste ínterim, o novo legado para a Capadócia pedido por Córbulo chegou: Lúcio Cesênio Peto, o cônsul do ano anterior (61). O exército foi dividido entre ele e Córbulo, com a IV Scythica, XII Fulminata, a recém-chegada V Macedonica e os auxiliares do Ponto, Galácia e Capadócia ficando sob o comando de Peto enquanto Córbulo manteve a III Gallica, VI Ferrata e X Fretensis. Por causa da busca incessante pela glória pessoal típica da sociedade romana da época, a relação entre os dois comandantes foi difícil desde o começo.[34] É notável que Córbulo tenha mantido consigo as legiões que havia liderado nos anos anteriores e deixado para o colega, que era o responsável pela campanha principal, as unidades mais inexperientes.[36] A força romana total reunida contra os partas era, de toda forma, considerável: apenas as seis legiões totalizavam 30 000 soldados. O número exato e a disposição das unidades auxiliares é incerta, mas havia sete alas de cavalaria e sete coortes de infantaria apenas na Síria, o que totalizava entre sete e nove mil soldados.[37]
Batalha de Randeia
Confiante na vitória, Peto respondeu à declaração de guerra parta e captura de Tigranocerta invadindo a Armênia[38] enquanto Cóbulo permanecia na Síria cuidando da fronteira do Eufrates.[39] Peto tinha apenas duas legiões consigo, a IV Scythica e a XII Fulminata,[35] e avançou em direção a Tigranocerta tomando algumas fortalezas menores no caminho, mas logo a falta de suprimentos forçou seu recuo para o oeste para passar o inverno.[38]
Os partas pretendiam inicialmente invadir a Síria, mas Córbulo montou uma poderosa e convincente demonstração de força militar, construindo uma forte flotilha de navios equipados com catapultas e uma ponte sobre o Eufrates, que lhe permitia criar rapidamente uma cabeça-de-ponte na margem parta. Os partas abandonaram seus planos na Síria e se voltaram com força total para a Armênia.[39] Lá, Peto havia dispersado suas forças e concedido prolongadas folgas para seus oficiais e os romanos foram pegos de surpresa pelo avanço parta. Ao saber dele, Peto inicialmente avançou para dar combate a Vologases, mas, depois que uma unidade de reconhecimento foi derrotada, ele se apavorou e iniciou uma retirada apressada. Peto enviou sua esposa e filho para a segurança da fortaleza de Arsamosata e tentou bloquear o avanço parta ocupando os passos dos montes Tauro com destacamentos de seu exército.[40] Ao fazê-lo, porém, enfraqueceu ainda mais suas forças, que foram derrotadas pelos partas. O moral dos romanos despencou e o pânico se espalhou pelo exército, que agora se via cercado por uma série de castros apressadamente construídos em Randeia (em latim: Rhandeia). Peto, que parece ter sucumbido ao desespero e apatia, enviou mensagens urgentes para que Córbulo viesse resgatá-lo.[41]
Córbulo, neste meio tempo, parece ter tido conhecimento do perigo que enfrentava seu colega e colocou parte de suas forças de prontidão; mas ele não marchou para ajudar Peto e alguns o acusaram de atrasar a ordem para aumentar a glória do resgate.[40] Seja como for, quando os pedidos de ajuda chegaram, ele respondeu rapidamente e marchou com metade do exército sírio, levando consigo muitas provisões em camelos. Ele logo encontrou membros perdidos do exército de Peto e conseguiu reuni-los à sua força.[42] Mas antes de conseguir chegar, Peto capitulou: os partas, sabendo que reforços se aproximavam, passaram a atacar incessantemente os romanos até que Peto enviou uma carta a Vologases pedindo os termos da rendição.[43] O tratado subsequente foi humilhante: os romanos não apenas deveriam desistir da Armênia e render todas as fortalezas que ainda mantinham como deveriam também concordar em construir uma ponte sobre o vizinho rio Arsânias para que Vologases pudesse cruzar em triunfo montado num elefante.[44] Para completar, o exército romano foi saqueado pelos armênios, que levaram até mesmo as roupas e armas romanas sem resistência. Para piorar, Tácito relata rumores de que eles foram obrigados a passar debaixo de uma canga, a humilhação máxima aos olhos romanos;[45]
As duas forças romanas se encontraram nas margens do Eufrates, perto de Melitene, em meio a cenas de tristeza mútua.[46] Enquanto Córbulo lamentava a reversão de todas as suas conquistas, Peto tentava convencê-lo a tentar reverter a situação invadindo novamente a Armênia. Córbulo recusou, alegando que não tinha autoridade para fazê-lo e que, ainda que tivesse, seu exército estava fraco demais para uma campanha efetiva.[47] No fim, Peto se retirou para a Capadócia e Córbulo, para a Síria, onde recebeu emissários de Vologases exigindo que ele evacuasse seu posto avançado no Eufrates. Córbulo, por sua vez, exigiu que os partas deixassem a Armênia. Vologases concordou e ambos os lados retiraram suas forças, deixando a Armênia uma vez mais sem um controle externo, mas sob a influência de facto dos partas até que uma delegação parta chegasse a Roma.[47]
Retorno de Córbulo e acordo de paz
Roma, enquanto isso, parece ter ignorado os eventos na Armênia. Tácito relata, de forma ácida, que "troféus pela guerra parta e arcos foram erguidos no centro do monte Capitolino" por um decreto do Senado Romano, mesmo a guerra não estando ainda decidida.[48] Fossem quais fossem as ilusões da liderança romana, elas foram destruídas pela chegada da delegação persa a Roma na primavera de 63. Suas exigências e o subsequente interrogatório do centurião que a acompanhou revelaram a Nero e ao Senado a verdadeira extensão do desastre que Peto havia escondido em suas correspondências.[49] Ainda assim, nas palavras de Tácito, os romanos decidiram "aceitar uma perigosa guerra a uma paz desgraçada"; Peto foi reconvocado e Córbulo foi encarregado novamente da campanha na Armênia, com poderes extraordinários (imperium), que o colocava acima de todos os governadores e reis clientes do oriente. O posto de Córbulo de governador da Síria foi deixado a cargo de Caio Céstio Galo.[49]
Córbulo reorganizou suas forças, recuando as derrotadas e desmoralizadas IV Scythica e XII Fulminata para a Síria, deixou a X Fretensis guardando a Capadócia e liderou suas veteranas III Gallica e VI Ferrata até Melitene, onde o exército invasor se reuniu. A ele se juntou ainda a V Macedonica, que esteve no Ponto no ano anterior e não foi manchada pela derrota, a XV Apollinaris, numerosas unidades auxiliares e diversos contingentes enviados pelos reis clientes.[50]
Depois que seu exército cruzou o Eufrates, seguindo uma rota aberta por Lúculo mais de um século antes, Córbulo enviou emissários a Tirídates e Vologases. Com a aproximação de uma força tão poderosa e cientes da habilidade de Córbulo como general, os dois reis arsácidas estavam ansiosos para negociar. De fato, Córbulo, sem dúvida sob ordens diretas de Nero, reiterou a antiga posição romana: se Tirídates aceitasse sua coroa de Roma, a guerra poderia ser evitada.[51] Tirídates prontamente aceitou negociar em Randeia, o cenário da humilhante derrota romana, foi o lugar escolhido. Para os armênios, o local tinha por objetivo lembrar aos romanos sua força; para Córbulo, era importante para expurgar a desgraça anterior, seja pela paz ou pela guerra.[52] Uma vez no local, Córbulo colocou o filho de Peto, que servia sob seu comando como legado, no comando de um grupo que tinha a missão de juntar os restos dos soldados romanos e assegurar que receberiam um sepultamento apropriado. No dia combinado, tanto Tirídates quanto Córbulo, cada um acompanhado por 20 cavaleiros, se encontraram entre os dois acampamentos.[53] Tirídates concordou em viajar até Roma para buscar a confirmação de sua coroa por Nero. Como sinal do acordo, ambos os exércitos, dias depois, com os dois exércitos foram perfilados com o uniforme de gala completo. Tirídates então se aproximou do acampamento romano, onde uma estátua de Nero havia sido erguida numa plataforma elevada e colocou seu diadema real aos seus pés como sinal de submissão.[54]
Consequências
Em 66, Tirídates visitou Roma para receber sua coroa e foi luxuosamente recebido por Nero, que aproveitou a ocasião para aumentar sua popularidade. Ele ordenou que as portas do Templo de Jano fossem fechadas, um sinal de que havia paz por todo o Império Romano.[56]
O imperador celebrou esta paz como uma grande conquista: ele foi aclamado como imperator e realizou um triunfo,[57] mesmo sem ter conquistado nenhum território novo e mesmo que a sua paz não fosse mais do que o reflexo de uma solução de compromisso. Pois, embora Roma tenha prevalecido militarmente sobre a Armênia, politicamente não havia alternativa válida à candidatura arsácida para o trono armênio.[58] A Armênia seria, daí em diante, reinada por uma dinastia iraniana e, apesar de sua lealdade nominal a Roma, cairia cada vez mais sob a influência parta.[1] No julgamento das gerações posteriores, "Nero perdeu a Armênia"[59] e, embora a paz em Randeia tenha de fato dado início a um período de relações relativamente pacíficas que duraria pelo menos cinquenta anos, a Armênia continuou a ser o pomo da discórdia entre romanos, partas e seus sucessores sassânidas.[60] No curto prazo, porém, a paz assegurada por Nero foi mantida por ambos os lados, mesmo quando a maior parte das forças romanas no oriente estavam envolvidas na Grande Revolta Judaica.[61]
Quanto a Córbulo, ele foi homenageado por nero como aquele que propiciou seu "triunfo", mas sua popularidade e influência no exército fizeram dele um rival potencial. Junto com o envolvimento de seu genro, Lúcio Ânio Viniciano, num fracassado complô contra Nero em 66, Córbulo tornou-se suspeito para o imperador.[62] No ano seguinte, enquanto viajava pela Grécia, Nero ordenou que ele fosse executado; ao saber disto, Córbulo se suicidou.[63][64]
A guerra também demonstrou aos romanos que o sistema defensivo no oriente, implantado por Augusto, não era mais adequado. Assim, os anos seguintes testemunharam uma grande reorganização do oriente romano: os reinos clientes do Ponto e Cólquida (64), Cilícia, Comagena e Armênia Menor (72) foram transformados em províncias romanas, o número de legiões na região aumentou e a presença romana nos estados clientes da Ibéria e Albânia foi reforçada com o objetivo explícito de circundar a Armênia.[65] O controle romano direto se estendeu por todo o trajeto do Eufrates, inaugurando a Fronteira do Oriente que sobreviveria até as conquistas muçulmanas do século VII.
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