Tetrahidrocanabinol (do inglêsTetrahydrocanabinol; THC, Δ9-THC, Δ9-Tetrahidrocanabinol, delta-9-tetrahidrocanabinol) ou na linguagem técnica, tetra-hidrocanabinol,[3] é a principal substância psicoactiva encontrada nas plantas do gênero Cannabis.[4] Pode ser obtida por extracção a partir dessa planta ou por síntese em laboratório.
O Δ9-THC (conhecido segundo uma anterior convenção de nomenclatura como Δ¹-THC) foi isolado na forma pura pela primeira vez em 1964 por Raphael Mechoulam, Yechiel Gaoni e Habib Edery no Instituto Weizmann em Rehovot, Israel, através da extracção a partir do haxixe com éter de petróleo, seguido de repetidas cromatografias.[5]
É discutido até que ponto este composto é responsável pelos efeitos verificados com o consumo da planta. Um estudo não encontrou diferenças nos efeitos subjetivos entre a maconha e o THC puro,[6] mas críticas a esse estudo apontam para que tenha sido usada maconha de fraca qualidade e parcialmente deteriorada, que não mantinha os componentes normais de terpenoides e flavonoides tais como canabinol (CBN) e canabidiol (CBD), defendendo que os efeitos do consumo da planta não se devem só ao THC.[7]
Na utilização clínica de Cannabis, os extractos são compostos geralmente pelos topos a florescer e com abundantes tricomas glandulares (sem sementes), com um potência de até 20% de THC.[7] Dados quanto à composição dos extractos usados para consumo recreacional são escassos devido ao facto do seu consumo ser ilegal em muitos países. Um estudo da quantidade de THC em amostras de maconha e haxixe apreendidas pela polícia italiana entre 1997 e 2004 revela valores que variam entre 0,5 e 20%, com a média a subir nos últimos anos para cerca de 13%.[8]
Sofre efeitos de primeira passagem, sendo metabolizado no fígado;
Efeito demora 1~6 horas a instalar-se, mas tem maior duração;
Absorção lenta e contínua no intestino;
Distribui-se por todo o organismo;
Absorvido por inalação atravessa os alvéolos pulmonares, entra na circulação e atinge o cérebro em minutos.
Uma vez absorvido para a corrente, as concentrações de THC diminuem rapidamente devido ao metabolismo feito pelo fígado, onde a depuração plasmática pode atingir 950 mL/min, ou à sequestração.
Acumula-se preferencialmente no tecido adiposo (devido à sua grande lipofília), atingindo o pico de concentração em 4~5 dias. É depois lentamente liberado, atingindo outros compartimentos como o cérebro.
No cérebro é distribuído de diferentes formas, alcançando concentrações mais elevadas nas áreas neocortical, límbica, sensorial e motora.
É metabolizado no fígado pela CYP 450 essencialmente a 11-hidróxi-THC (potencialmente mais potente que o THC), mas existe uma enorme variedade de metabólitos, com elevados tempos de meia-vida. Posteriormente o 11-hidroxi-THC pode ainda ser substrato da álcool desidrogenase.
Devido à sequestração, o tempo de meia-vida do THC pode variar desde 20h até 10~13 dias.
25% dos metabolitos são eliminados na urina sob a forma de éster de ácido glucurónico.
A maioria é liberada no intestino pelo fígado, e pode ser reabsorvido (circulação entero-hepática), prolongando a sua acção, ou eliminado nas fezes onde se verifica a predominância da forma não conjugada.
A eliminação total pode demorar até 30 dias.
Devido à sequestração e à existência de metabolitos activos, é difícil estabelecer uma relação entre a concentração de THC no plasma ou urina e a intoxicação.
Interacções Farmacológicas
O THC reforça a acção sedativa de outras substâncias psicotrópicas como o álcool e as benzodiazepinas.
Reforça ainda a acção de relaxantes musculares, broncodilatadores, medicamentos antiglaucoma, da acção analgésica de opiáceos, do efeito antiemético das fenotiazinas e do efeito antiepilético das benzodiazepinas.
Devido às suas propriedades, os canabinoides podem ser potencialmente usados com vista à analgesia, relaxamento muscular, imunossupressão, como anti-inflamatórios, antialérgicos, sedativos, para melhorar o humor, como estimulante do apetite, antiemético, diminuidores da pressão intraocular, broncodilatação, neuroproteção e efeitos antineoplásicos.
O THC teve aprovação do FDA em 1986. Actualmente é usado um THC sintético, o dronabinol (Marinol, Unimed, Marietta, Ga., USA) com duas indicações terapêuticas: náuseas e enjoos induzidos pela quimioterapia e anorexia associada à SIDA.
Verificou-se que agonistas canabinoides inibem a proliferação celular no cancro da mama, na mulher e in vitro, e apresentam actividade antineoplásica em gliomas malignos em ratos
Algumas pesquisas sugerem que o THC pode estar indicado em caso de epilepsia, depressão, distúrbio bipolar, quadros de ansiedade, dependência de opiáceos e álcool, sintomas de retirada, assim como distúrbios do comportamento na doença de Alzheimer, mas revela-se necessária uma investigação mais aprofundada.
Provas crescentes demonstram a efectividade dos efeitos do THC contra os espasmos provocados pela esclerose múltipla, lesão na medula espinhal e na síndrome de Tourette (não só diminuição dos tiques, mas também melhoria do comportamento). Verifica-se também actividade em outras desordens do movimento, como distonia.
A acção do THC no tratamento da asma e do glaucoma está praticamente confirmada.
Clinicamente, o THC é usado no tratamento das náuseas e vómitos refractários causados por medicamentos antineoplásicos, no tratamento da perda de apetite na anorexia e na caquexia em doentes com HIV/SIDA.
Toxicidade
Os benefícios terapêuticos atribuídos à Cannabis têm sido alvo de alguma relutância, uma vez que os seus efeitos adversos tendem a tornar a relação risco/benefício desfavorável ao seu uso clínico.
Toxicidade aguda
A toxicidade aguda do THC é muito baixa. A dose letal em humanos não é ainda conhecida nem há relatos comprovados de morte em seres humanos por THC ou Cannabis. A gravidade, duração e frequência destes sintomas variam com a susceptibilidade do indivíduo, com meio cultural em que este se insere e com a frequência e intensidade do consumo prévio de Cannabis.
No cérebro, o consumo agudo de Cannabis pode desencadear efeitos adversos psicóticos, cognitivos e no controlo psicomotor.
Efeitos no controle psicomotor
Desajustes no controle e coordenação motora
Redução da actividade psicomotora
Alterações da percepção sensorial e temporal
Perturbações da comunicação oral
Inibição do movimento(Fonte?).(fonte2?)
Efeito cognitivos
Dificuldades de concentração
Distúrbios na memória de curto prazo
Danos em todos os estágios da memória incluindo codificação, consolidação e recuperação
Dificuldades de atenção
Diminuição do desempenho aritmético
Efeitos amnésicos (relacionados com a inibição da liberação de neurotransmissores)
Efeitos Psíquicos
Euforia.
Sensação de bem-estar
Sonolência
Sedação
Síndrome de ansiedade
Despersonalização/Desrealização
Aumento do apetite
Risos
Efeitos físicos
Os efeitos físicos do THC têm menor relevância que os efeitos comportamentais, excepto nas crianças que se intoxicam por acidente. Entre outros efeitos destacam-se:
Taquicardia
Aumento da pressão diastólica associada à diminuição do tónus paras-simpático
Hipotensão ortostática (que causa tonturas e síncope)
Hipossalivação e secura da boca
Distúrbios de acomodação oftálmica e diminuição da reacção da pupila à luz
Diminuição da secreção lacrimal
Dores de cabeça, náuseas, vómitos
Relaxamento muscular
Por causar perturbações na coordenação motora, na percepção e nas funções cognitivas e afectivas, o consumo de THC pode apresentar perigos na condução de automóveis, pilotagem de aviões e utilização de máquinas.
Para um ser humano morrer devido a dose letal de tetraidrocanabinol seria necessário fumar 15.000 charros em 20 minutos (observação: charro equivale a baseado, cigarro de maconha, em português brasileiro).
Toxicidade crônica
O uso de Cannabis por longos períodos de tempo não está associado à morte de animais ou humanos, mas estão descritos diversos efeitos crónicos devido ao uso de Cannabis, efeitos estes que dependem da intensidade e duração do consumo.
Risco de fumar
O uso fumígeno de Cannabis está relacionado com a diminuição da capacidade de respiração durante o exercício físico, dificuldades respiratórias, produção de expectoração, tosse crónica. Note-se que esses sintomas devem-se principalmente à inalação de produtos de combustão da Cannabis, incluindo hidrocarbonetos policíclicos mutagénicos, e compostos químicos como a amônia, não directamente relacionados com o THC.
Efeitos psicóticos
Indução do aparecimento de psicoses em pacientes pré-dispostos, devido à modulação das concentrações de dopamina por acção nos receptores CB1.
Síndromes de confusão
Depressão
Ansiedade
Efeitos na função cognitiva
Danos na memória
Dificuldades de atenção
Diminuição da capacidade para organizar e integrar informação complexa
Tem 1% a mais de chance de desenvolver esquizofrenia de um não fumante
Existe alguma controvérsia relativa à reversibilidade dos efeitos cognitivos: alguns estudos defendem que, após um período de abstinência, os sintomas são reversíveis; outros defendem que o consumo massivo de Cannabis está associado a danos irreversíveis na performance cognitiva.
Riscos do consumo na adolescência
Mais efeitos tóxicos na saúde mental dos adolescentes do que em adultos
Maior risco de depressões
Síndrome de Burnout (Desmotivação), caracterizado por apatia, retraimento social e dificuldades de concentração, o que implica consequências na performance académica
Efeitos em outros órgãos
O consumo de Cannabis a longo prazo tem um impacto negativo em sistemas de órgãos incluindo o sistema imunitário e a circulação; entre outros efeitos destacam-se:
Influência em processos hormonais por interagir com o eixo hipotálamo-hipófise
Inibição da motilidade gástrica e do esvaziamento gástrico
Aumento do risco da progressão da fibrose na hepatite C crónica
Influência na resposta humoral e na resposta imunitária dos linfócitos T (estudos experimentais)
Decréscimo na contagem de espermatozoides; inibição da reacção do acrossoma e diminuição da motilidade dos espermatozoides (estudos in vitro)
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