Nota: '"Dualidade" e "Dualismo cartesiano" redirecionam para este artigo. Para outros significados, veja Dualidade (desambiguação).
Dualismo é uma concepção filosófica ou teológica do mundo baseada na presença de dois princípios ou duas substâncias ou duas realidades opostas, irredutíveis entre si e incapazes de uma síntese final ou de recíproca subordinação. É dualista por excelência qualquer explicação metafísica do universo que suponha a existência de dois princípios ou realidades não subordináveis e irredutíveis entre si.
A ideia aparece na filosofia ocidental já nos escritos de Platão, baseados nos ensinamentos de Sócrates, e de Aristóteles, que afirmam, por diferentes razões, que a inteligência do Homem (uma faculdade do espírito ou da alma) não pode ser assimilada ao seu corpo, nem entendida como uma realidade física.[2][3]
No entanto, o uso do termo na acepção mais difundida pela tradição filosófica data da segunda metade do século XVIII, com Christian Wolff (1670-1754). Wolff deslocou o emprego da palavra para a relação entre corpo e alma, opondo o dualismo ao monismo. Segundo ele "são dualistas aqueles que admitem a existência de substâncias materiais e de substâncias espirituais",[6][7] e o fundador do dualismo teria sido Descartes, que formalizou a versão mais conhecida do dualismo em 1641, ao reconhecer a existência de duas espécies diferentes de substâncias: a corpórea e a espiritual.
Descartes foi o primeiro a assimilar claramente o espírito (substância imaterial) à consciência e distingui-lo do cérebro, que seria o suporte da inteligência. Chamou a mente de res cogitans ("coisa pensante") e o corpo de res extensa ("coisa extensa", isto é, que ocupa lugar no espaço). A ligação entre a mente e corpo, segundo ele, seria feita através da glândula pineal, uma pequenina parte do cérebro. Foi Descartes, portanto, quem primeiro formulou o problema do corpo-espírito do modo como se apresenta modernamente, no chamado dualismo corpo-mente.[8]
Assim, em termos metafísicos, a realidade se constitui de duas substâncias - material e espiritual - sendo a substância material, a realidade sensível; e o espírito, o não físico, não material, constituindo a realidade mental ou espiritual.
Posteriormente, o uso do termo foi muito ampliado. "Dualismo" passou a designar toda contraposição de tendências irredutíveis entre si, tal como a oposição aristotélica entre matéria e forma , assim como a oposição medieval entre existência e essência e o dualismo kantiano da necessidade e liberdade, fenômeno e númeno. Já no século XX, Arthur O. Lovejoy examinou historicamente o dualismo e defendeu a existência de dois tipos de realidade - os objetos e as ideias que eles representam - em The Revolt Against Dualism (1930).[9] O título da obra é inadequado, pois Lovejoy argumenta a favor de uma espécie de dualismo ontológico - e não contra, como o título sugere. Segundo ele, ideias e objetos, dada a sua incongruência espaço-temporal, não podem ser idênticos e, portanto, teriam naturezas diferentes, separadas, não sendo possível estabelecer uma relação entre ambos.[10] Por volta dos anos de 1950, o britânico Gerald Gardner criou a wicca, religião neopagã baseada no culto bruxo e no dualismo, classificando os dois princípios como Deusa-mãe e Deus cornífero (o feminino e o masculino). O dualismo é a principal crença na religião Wicca.
Há uma série de desastres famosos na história da filosofia, e Descartes é um dos maiores desastres. Vivemos em um mundo, não dois ou três ou mais, e o que consideramos como consciência e a mente é uma característica biológica de certos tipos de organismos. A maior catástrofe de Descartes é seu dualismo, a ideia de que a realidade se divide em dois tipos de substâncias, matéria e espírito. Descartes foi incapaz de ver isso, porque ele achava que a consciência só poderia existir em uma alma, e a alma não era uma parte do mundo físico.[11]
Anne Conway também foi uma crítica ao dualismo, onde apresentou seus argumentos para o que ela chama de convertibilidade da matéria e do espírito. Com isso, ela quer dizer que a matéria e o espírito não são diferentes substâncias, mas que são passíveis de mudar entre um e outro. Assim, entidades materiais se tornam espirituais e vice-versa, o que contraria o dualismo. Para ela, o dualismo era inconsistente por fazer uma distinção rígida entre matéria e espírito.[12]
Referências
↑HART, W.D. (1996) "Dualism", in Samuel Guttenplan (org) A Companion to the Philosophy of Mind, Blackwell, Oxford, 265-7.
↑PLATÃO (428/427 a. C. - 347 a.C.). Apologia de Sócrates, Criton e Fédon.