Seus pais eram primos, descendentes em linhas afastadas de Francisco Rodrigues Alves, o primeiro sesmeiro da cidade de Vassouras. Por outro lado, embora tivesse sobrenome parecido com o do 2.º Barão de Pati do Alferes, o seu sobrenome Lacerda origina-se de seu bisavô, um confeiteiro português de origem pobre e que se estabeleceu em Vassouras. Seu bisavô, logo que veio para o Brasil, se casou com uma descendente de Francisco Rodrigues Alves (estes serão os pais de seu avô paterno, Sebastião Lacerda).[3] Seu bisavô português chamava-se João Augusto Pereira de Lacerda e pertencia a uma das principais famílias da nobreza açoriana, os Lacerdas do Faial, descendentes das nobres famílias dos Pereiras, senhores da Feira, e dos Lacerdas, descendentes dos reis de Castela e Leão e dos de França.[5]
Ingressou em 1929 no curso de Ciências Jurídicas e Sociais da então Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro, atual Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Durante seu período acadêmico, destacou-se como exímio orador e participou ativamente do movimento estudantil de esquerda no Centro Acadêmico Cândido de Oliveira. Devido ao grande envolvimento em atividades políticas, abandonou o curso em 1932.
Sua primeira ação contra o governo de Getúlio Vargas implantado com a revolução de 1930 deu-se em janeiro de 1931, quando planejou incentivar marchas de desempregados no Rio de Janeiro e em Santos durante as quais ocorreriam ataques ao comércio. A conspiração comunista foi descoberta e desbaratada pela polícia liderada por João Batista Luzardo.[6]
Em março de 1934 ficou responsável pela leitura do manifesto de lançamento oficial da Aliança Nacional Libertadora (ANL), entidade ligada ao Partido Comunista do Brasil, em uma solenidade na cidade do Rio de Janeiro à qual compareceram milhares de pessoas.
No ano seguinte publicou, com o pseudônimo de Marcos, um livreto contando a história do quilombo de Manuel Congo. Apesar do viés de propaganda comunista juvenil, o livreto resultou da primeira pesquisa histórica feita sobre um assunto que fora quase esquecido.
Quando ocorreu o fracasso da Intentona Comunista de 1935, teve que se esconder na velha chácara da família em Comércio (atual localidade de Sebastião de Lacerda no município fluminense de Vassouras) e ser protegido pela família influente.
Rompeu com o movimento comunista em 1939, dizendo considerar que tal doutrina "levaria a uma ditadura, pior do que as outras, porque muito mais organizada, e, portanto, muito mais difícil de derrubar". A partir de então, como político e escritor, consagrou-se como um dos maiores porta-vozes das ideologias conservadora e direitista no país, e grande adversário de Getúlio Vargas, e dos movimentos políticos trabalhista e comunista, sendo contado como um dos principais oradores da ‘Banda de música da UDN’.[7]
Inimigo político de Getúlio Vargas, Carlos Lacerda foi o grande coordenador da oposição à campanha de Getúlio à presidência em 1950 e durante todo o mandato constitucional do presidente, até agosto de 1954. Uniu-se a militares intervencionistas e aos partidos oposicionistas (principalmente a UDN) num esforço conjunto para derrubar o presidente Vargas através de acusações que publicava em seu jornal, Tribuna da Imprensa.
Lacerda foi vítima de atentado a bala na porta do prédio onde residia, número 180 da Rua Tonelero, em 5 de agosto de 1954, quando voltava de uma palestra no Colégio São José, no bairro da Tijuca. No Atentado da Rua Tonelero, como entrou para a história, morreu o major da AeronáuticaRubens Vaz, membro de um grupo de jovens oficiais que se dispuseram a acompanhá-lo e protegê-lo das ameaças que vinha sofrendo. Atingido de raspão em um dos pés, Lacerda foi socorrido e medicado em um hospital. Lá mesmo, acusou os homens do Palácio do Catete, sede do poder executivo, como mandantes do crime.
A pressão midiática e a comoção pública com a morte do Major Rubens Vaz obrigaram o governo a instaurar um IPM para investigar o atentado. Rapidamente, os militares ligados a Lacerda fizeram do inquérito o palco perfeito para fomentar ainda mais a crise. Uma série de investigações levou à prisão dos autores do crime, que confessaram o envolvimento do chefe da guarda pessoal de Vargas, Gregório Fortunato e do irmão do presidente, Benjamim Vargas.
Com a conclusão do IPM (chamado na imprensa de "República do Galeão") instaurado pelo Brigadeiro Nero Moura, Ministro da Aeronáutica, o presidente do Inquérito, indicado pelo Ministro, Coronel João Adil de Oliveira informou, em audiência com o presidente Vargas, que havia a existência de indícios sólidos sobre a participação de membros da Guarda no atentado.
Dezenove dias depois, com o agravamento da crise política e o ultimato das Forças Armadas pela sua renúncia, Getúlio Vargas suicidou-se com um tiro no peito em 24 de agosto. O suicídio reverteu a opinião pública e provocou uma imensa onda de comoção e revolta. Isso obrigou Lacerda e parte de seu grupo a deixar o país. Na época, milhares de revoltosos tomaram as ruas, empastelando jornais do Globo, ligados à oposição.
As manobras intervencionistas começaram já no período eleitoral, quando ocorreu o episódio da Carta Brandi, uma notícia supostamente falsa plantada pelos opositores no jornal de Lacerda que envolvia João Goulart num pretenso contrabando de armas da Argentina para o Brasil.
Após a eleição de Juscelino, Carlos Luz, presidente interino à época, aliado aos militares e a Carlos Lacerda, tramaram uma nova intervenção. A bordo do Cruzador Tamandaré, fizeram a resistência, no entanto o navio fora alvejado a tiros pela artilharia do exército a mando do General Teixeira Lott, que nas eleições seguintes, em 1960, se candidataria à presidência. Foi o último tiro de guerra disparado na Baía da Guanabara no Rio de Janeiro. Durante anos, o episódio ficou conhecido como o golpe de Lott, um dos únicos golpes legalistas da história do Brasil.
Vencido após a sua tentativa de golpe, Lacerda partiu para um exílio breve em Cuba, que ainda estava sob o regime do caudilho Fulgencio Batista, antes de Fidel chegar ao poder através da Revolução Cubana.
Voltou em seguida para reassumir sua cadeira de deputado e continuar a oposição a Juscelino Kubitschek, atacando, entre outras coisas, a construção de Brasília.
Governador da Guanabara
Com a transferência da capital para Brasília, candidatou-se ao governo do recém-criado estado da Guanabara. Apesar do grande favoritismo inicial, Lacerda foi eleito por pequena margem, tendo sido ajudado pela divisão de votos populares que ocorreu com a candidatura de Tenório Cavalcanti ao mesmo cargo.[3]
Em 24 de agosto de 1961, fez um discurso em cadeia nacional de rádio e televisão atacando o presidente Jânio Quadros, seu ex-aliado. A renúncia de Jânio ocorreu no dia seguinte, em 25 de agosto. Em debate na Band no ano de 1982, Quadros afirmou que Lacerda foi "quem provocou o 25 de agosto", chamando-o também de inimigo figadal seu e do povo brasileiro.[8]
Durante seu governo, foi divulgado que policiais assassinavam os mendigos que perambulavam pela cidade e jogavam seus corpos no rio da Guarda, afluente do rio Guandu. O governo de Carlos Lacerda foi acusado pela imprensa de oposição de ter dado instruções aos policiais para que realizassem estes assassinatos. Tal assunto foi alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa, do então Estado da Guanabara, onde Paulo Duque foi o seu relator.[9] Lacerda demitiu o Secretário de Segurança e o envolvimento dos escalões superiores do governo nestes fatos nunca foi provado.
"Viva a liberdade, viva o Brasil, viva a honra do Brasil, viva a dignidade do Brasil!
Almirante Aragão, Almirante Aragão, assassino monstruoso, incestuoso miserável. Almirante Aragão, não te aproximes, porque eu te mato com meu revólver! Canalha, bandido, traidor, a sua hora chegou! Foge enquanto é tempo, garanta a impunidade. Bandido, matador e mandante de inocentes soldados para matar outros soldados, para esconder sua desonradez, canalha!"
Voltou-se contra o novo regime em 1966, com a prorrogação do mandato do presidente Castelo Branco. Segundo Lacerda, a prorrogação do mandato de Castelo Branco levaria o recém-instalado governo "revolucionário" a se consolidar como um regime militar permanente. Confiava no sucesso do governo que tinha realizado no estado da Guanabara para enfrentar o candidato de oposição Juscelino Kubitschek.
Em novembro de 1966 lançou a Frente Ampla, movimento de resistência ao Regime militar de 1964, que seria liderada por ele e por seus antigos opositores João Goulart e Juscelino Kubitschek. Foi cassado em dezembro de 1968 pelo regime militar e levado preso para um Regimento de Cavalaria da Polícia Militar, onde ficou na mesma cela que o seu antigo companheiro do PCB Mário Lago, com quem não falava havia décadas.[25] Em seguida, voltou a trabalhar por pouco tempo como jornalista, antes de dedicar-se às atividades na editora de sua propriedade, Nova Fronteira.[26]
Morreu na Clínica São Vicente em 1977, vítima de um infarto no miocárdio. O fato de os três líderes da Frente Ampla terem morrido em datas muito próximas levantou uma teoria de que essas mortes pudessem estar relacionadas, o que nunca foi comprovado.
Em 20 de maio de 1987, através do decreto federal nº 94.353, teve restabelecidas, post mortem, as condecorações nacionais que lhe foram retiradas e Lacerda foi reincluído nas ordens do mérito das quais fora excluído em 1968.
Escreveu numerosos livros, entre eles: O Caminho da Liberdade (1957), O Poder das Ideias (1963), Brasil entre a Verdade e a Mentira (1965), Paixão e Ciúme (1966), Crítica e Autocrítica (1966), A Casa do Meu Avô: pensamentos, palavras e obras (1977).
Depoimento (1978) e Discursos Parlamentares (1982) foram compilados e publicados após a sua morte.
Representações na cultura
Carlos Lacerda já foi retratado como personagem no cinema e na televisão:
O nome de Carlos Lacerda foi usado pelo seu sobrinho-neto, Marcio Lacerda, usando-se disso para se promover na política. E a medida que cresciam as influências das forças de esquerda depois da Ditadura, evitou a associação do nome de seu tio-avô ao conservadorismo.[29]
↑FORJAZ, Jorge (2007), Genealogias da Ilha Terceira, 7, Lisboa, p. 461.
↑Brasil, CPDOC-Centro de Pesquisa e Documentação História Contemporânea do. «JOAO BATISTA LUZARDO». CPDOC - Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil. Consultado em 5 de agosto de 2022
DULLES, John Walter Foster. Carlos Lacerda: a vida de um lutador. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000. 2 vols. Contém um CD [Primeira edição brasileira: 1992]