Batizado em homenagem ao cabo Arkona na ilha de Rügen, no atual estado alemão de Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental, foi lançado em maio de 1927, sendo considerado um dos mais belos e luxuosos navios da época, bem como o quarto maior navio da marinha mercante alemã.
Pertencente à Hamburg Süd, possuía 27 561 toneladas de arqueação bruta, 205,9 metros de comprimento, 25,8 metros de largura, calado de 12,8 metros, propelido por duas turbinas a vapor com potência de 17 500 KW.[1] Por 12 anos, até a eclosão da guerra em 1939, fazia viagens regulares entre Hamburgo e o Rio de Janeiro.[2]
Em 1940, o Cap Arcona foi incorporado pela Marinha Alemã e utilizado no Mar Báltico, como um navio de alojamento. Em 1942, foi utilizado como cenário para a produção do filme de propaganda nazistaTitanic, lançado no ano seguinte.
No final de abril de 1945, Karl Kaufmann, Gauleiter de Hamburgo e Comissário do Reich para a Marinha Mercante, retirou o Cap Arcona e o Deutschland do comando da Marinha Alemã, transferindo-os para o comando da SS, e, em seguida, ordenou-lhes que rumassem para a cidade norte-alemã de Lübeck.
Nessa cidade, os dois grandes navios juntar-se-iam a dois outros vapores menores, o Thielbek e o Atenas. As duas embarcações maiores acomodariam os prisioneiros de campos de concentração da região, especialmente o de Neuengamme e seus subcampos, ao passo que as menores efetuariam o transbordo.
Cerca de 5 000 prisioneiros evacuados à pressa do campo de concentração de Neuengamme (a poucos quilômetros a sudeste de Hamburgo), foram levados a bordo do Cap Arcona entre 18 e 26 de abril, juntamente com cerca de 400 guardas da SS, 500 artilheiros navais e 76 tripulantes. No Thielbek, estavam mais 2 800 prisioneiros de Neuengamme. Havia também nos navios, prisioneiros do campo de Stutthof, perto de Dantzig, metade das quais eram prisioneiros de guerra russos e polacos que estavam sendo evacuados antes do avanço das tropas britânicas.[3] Com as péssimas condições de vida que prevaleciam na Alemanha durante as semanas finais da guerra, as condições destinadas para os prisioneiros a bordo dos navios eram particularmente terríveis. Muitos dos presos, hermeticamente embalados, estavam doentes. Água e alimentação eram escassos.[2]
O próprio capitão do Cap Arcona, Heinrich Bertram, havia se recusado em receber os prisioneiros, protestando que o navio podia acomodar apenas 700. Ameaçado de prisão e execução, ele voltou atrás e viu como milhares de prisioneiros eram amontoados em porões de seu navio.[3]
Kaufmann, o Gauleiter, afirmaria durante os Julgamentos de Nuremberg que os prisioneiros seriam destinados à Suécia. No entanto, no mesmo julgamento, Bassewitz-Behr, chefe da Gestapo em Hamburgo, disse que Heinrich Himmler determinara a destruição de qualquer prova acerca da existência dos campos de concentração e, nesse particular caso, os navios deveriam ser deliberadamente afundados com todos os prisioneiros a bordo.[4]
Em 2 de maio, os britânicos do II Exército atingiram as cidades de Lübeck e Wismar e ocuparam-nas, praticamente, sem resistência. Na ocasião, a Cruz Vermelha Internacional informou ao comando britânico que entre 7 000 e 8 000 pessoas estavam confinadas a bordo dos navios na Baía de Lübeck.
Ataque e naufrágio
Na tarde do dia seguinte, quatro dias depois do suicídio de Hitler e apenas um dia antes da rendição incondicional das tropas alemãs na região noroeste da Alemanha, o Cap Arcona, o Thielbek, e o Deutschland (possivelmente convertido em um navio-hospital, mas não identificado como tal) foram atacados, como parte dos ataques em geral sobre o transporte marítimo no Mar Báltico, por uma esquadrilha de caça-bombardeiros “Tufões” da RAF, comandada por Sir Arthur Coningham.
Em sucessivas ondas de ataque, bombardearam e dispararam contra o Cap Arcona e depois contra o Thielbek. O Atenas, que carregava prisioneiros de volta ao porto, uma vez que o Cap Arcona já se encontrava superlotado, conseguiu salvar-se, pois seu capitão rumou aceleradamente ao cais de Neustadt, a tempo içar as bandeiras brancas, poupando assim a vida de seus 1 998 passageiros.[3]
O Thielbek, atingido por foguetes, bombas e metralhadoras, afundou-se em apenas 20 minutos. Aproximadamente, apenas 50 dos prisioneiros sobreviveram.
O Cap Arcona virou de lado e adernou, ficando uma parte submersa e a outra a incendiar-se. Muitos morreram queimados, presos no interior do navio e outros conseguiram escapar ao se agarrarem casco. Dos que saltaram para a água, muitos morreram afogados ou morreram de frio (a temperatura da água era de cerca de 7°C/44,6°F). Equipados com coletes salva-vidas, a maioria dos guardas da SS pode saltar para fora do navio, e, ainda assim, atiravam nos prisioneiros que tentavam escapar. Barcos pesqueiros e traineiras acudiram os navios atacados e conseguiram resgatar 16 marinheiros, 400 homens e 20 mulheres da SS. Muitos sobreviventes, tentando nadar até a praia, foram metralhados sem dó por soldados da SS, estacionados na costa. Entre 314[3] e 350 dos ex-detentos do campo de concentração que estavam a bordo do Cap Arcona sobreviveram. O número de mortos foi estimado em 5 000 pessoas (somente nesse navio).
Os pilotos britânicos afirmaram que eles não sabiam que os navios estavam carregados de prisioneiros que haviam sobrevivido aos campos, e foi só muitos anos mais tarde, em 1975, que souberam que haviam massacrado seus próprios aliados.[3]
No entanto, algumas fontes sugerem que elementos do comando britânico sabiam quem eram os ocupantes, mas não conseguiram passar a informação a tempo. Os comandantes da RAF que ordenaram o ataque suspeitavam que os navios estariam servindo para transportar membros da SS em fuga para a Noruega, ainda controlada pelo Terceiro Reich.
Seriamente danificado e incendiado, o navio finalmente virou. Seu casco emborcado mais tarde encalhou próximo à costa e os destroços foram finalmente desmantelados em 1949. Nos dias que se seguiram, centenas de cadáveres apareceram nas praias próximas, e enterrados em valas comuns em Neustadt in Holstein.[1] Tendo afundado em águas rasas, o naufrágio permaneceu parcialmente sobre a água como uma lembrança amarga da catástrofe [54° 03,9′ N, 10° 50,45′ L]
Por quase 30 anos, partes de esqueletos continuaram a aparecer nas praias, sendo que o último foi encontrado em 1971, por um garoto de doze anos de idade. Segundo documentos do Instituto Holandês de Documentação de Guerra (NIOD), o governo da Suécia tinha avisado o governo britânico de que os prisioneiros estavam a bordo dos navios.
Um monumento foi erguido em Neustadt in Holstein em memória das vítimas do ataque ao Cap Arcona, dos quais eram de 28 diferentes nacionalidades: americanos, belgas, canadenses, tchecos, suíços, dinamarqueses, estonianos, finlandeses, franceses, alemães, grego, húngaro, italiano, letão, lituano, luxemburguês, norueguês, polonês, romeno, russo, espanhol, ucraniano, iugoslavo e outros.[5]
A história desta tragédia é representada no Museu Cap Arcona em Neustadt in Holstein, inaugurado em 1990.
↑Himmler havia editado uma ordem a todos os comandantes de campo de concentração que “a rendição era inaceitável, e que os campos deveriam ser imediatamente evacuados, não podendo qualquer prisioneiro cair vivo nas mãos do inimigo”