A divergência quanto ao nome da batalha existiu desde o começo entre os brasileiros e os argentinos. Estes, que se encontravam em terra desconhecida, chamaram a batalha de Ituzaingó, pelo possível fato de terem visto um arroio com esse nome, perto do qual combateram, em uma carta geográfica. Já os brasileiros, por enfrentarem o inimigo próximo à vizinhança do passo do Rosário, no rio Santa Maria, a chamaram desde o primeiro instante com essa dominação: batalha do passo do Rosário.[4]
Contexto histórico
Em 1816, as tropas portuguesas invadiram a Banda Oriental (atual Uruguai) e depois da derrota de Artigas, em 1820, a ocuparam por completo. Em fevereiro de 1825, foi anexada ao Império brasileiro, com o nome de Província Cisplatina.[5] Com o Congresso de Vienna, em que os ingleses expuseram a questão da independência das colônias americanas, os povos sulamericanos viram essa atitude como exemplo e aspiração.[6] Liderados pelo Coronel Lavalleja, orientais provenientes de Buenos Aires iniciaram o movimento - no Uruguai - de independência da última nação de origem espanhola da América do Sul. Em pouco tempo, a revolta atingiu os muros de Montevidéu. Em 25 de agosto de 1825, em Florida, uma assembléia de orientais declarou a independência da Província Cisplatina e sua confederação às Províncias Unidas do Rio da Prata (Argentina). Dois meses depois, em 25 de outubro de 1825, o Congresso de Buenos Aires proclamou a Província Cisplatina reintegrada às Províncias Unidas do Rio da Prata.[7] O Brasil, que até então mantinha a posse desse território, declarou guerra às Províncias Unidas do Prata, em 10 de dezembro de 1825[5] e decretou bloqueio naval do estuário do Rio da Prata.[7]
No final do ano de 1826, as Províncias Unidas do Rio da Prata concentravam seu exército na cidade de Durazno, constituído de orientais e argentinos, sob comando do General Carlos Maria de Alvear. Já no Império do Brasil, de início, o imperador deu pouca atenção para essa revolta, dado que se encontrava face a outras questões, que se registravam em Províncias consideradas mais importantes ou estratégicas, como a do Maranhão, a do Pará, a de Pernambuco, a da Bahia e na própria capital, a cidade do Rio de Janeiro. Contudo, quando a revolta rapidamente ganhou apoio da população uruguaia, deixando apenas as pequenas guarnições de Montevideu e da cidade de Colônia para enfrentá-la, D. Pedro teve que recrutar o mais rápido possível uma força de combate e enviá-la para o sul. Contava, assim, com poucos recursos para debelar o levante na mais meridional das províncias do Império. Enquanto o Brasil teve que improvisar seu exército, comandado pelo Marquês de Barbacena, Alvear possuía um exército organizado e veterano das batalhas pela independência na bacia do Prata.[7]
A batalha
O exército argentino-oriental, comandado pelo general Carlos María de Alvear, ocupava as duas lombadas de oeste, mais próximas do Passo do Rosário; o brasileiro, dirigido pelo tenente-general Marquês de Barbacena, que ia em marcha de São Gabriel para o Passo do Rosário, tomou posição na lombada oriental.[8] O vale, entre essas alturas, era cortado em quase toda a sua extensão por um barranco ou sanja, que só dava fácil passagem em alguns lugares, e seguia a direção norte-sul das colinas. Foi nesse vale e sobre as duas lombadas paralelas que se deu a batalha. Desde o dia 6 Bento Manuel Ribeiro fora destacado aquele coronel para observar a direção da marcha dos argentino-orientais, que quase todos os chefes rio-grandenses acreditavam em plena retirada.[8] Na manhã deste dia 20, estava em frente ao Passo do Umbu, no Ibicuí do monte Grande, entre a margem esquerda deste rio e a direita do Cacique, a seis ou sete léguas (cerca de 39,6 km a 46,2 km) do campo de batalha, onde poderia ter chegado pelas 11h (mss. do barão de Caçapava), porque um dos seus piquetes avançados deu aviso, às 7h30, de que ouvia fogo de artilharia e mosquetaria na direção do Passo do Rosário, a sudoeste; no entanto, Bento Manuel, em vez de procurar reunir-se ao seu general, afastou-se para leste, indo acampar à noite em frente ao Passo de São Pedro.[8] Na lombada de que anteriormente se fez menção, colocou-se o Exército brasileiro. A cavalaria aliada era em muito superior à brasileira.[8] Além dessa vantagem, o exército aliado tinha a vantagem de estar descansado, e no campo de batalha que escolhera, ao passo que o exército brasileiro, avançando a marchas forçadas, caminhava desde 1h, quando às 6h o encontrou, e assim teve de entrar em ação.[8] Às 7h30 começou o fogo de artilharia. Pouco depois, por ter os cavalos cansados, segundo disse, o coronel Bento Gonçalves da Silva deixou a posição, que ocupava no vale, ao lado do barão de Cerro Largo, e foi postar-se na extrema direita da linha brasileira.[8]
Barbacena enviou maior parte de sua infantaria para atacar o primeiro corpo do exército aliado, comandado por Lavalleja, que estava localizado com a artilharia no centro do campo de batalha. Por outro lado, o terreno escolhido por Alvear para dar combate era propício para a movimentação de unidades de cavalaria (as quais o Exército Republicano possuía em vantagem numérica de 3 para 1).[7]
O marquês de Barbacena tomou a iniciativa, levando ao centro dos aliados a 1ª divisão.[8] Começaram então as cargas de cavalaria. A pequena brigada do coronel Miguel Pereira de Araújo Barreto repeliu e perseguiu na direita os Colorados de Conchas, distinguindo-se muito nesta carga o 40º de milícias, do tenente-coronel José Rodrigues Barbosa; na esquerda, os voluntários do barão de Cerro Largo, apoiados pelas brigada Barbosa Pita, destroçaram uma coluna de cavalaria de que fazia parte o 9º regimento, de Manuel Oribe.[8]
A brigada da infantaria do coronel Leitão Bandeira avançava sobre o centro das forças republicanas. Alvear enviou contra esses três batalhões o general Brandsen, francês de nascimento, veterano das Guerras de Napoleão e da independência (era coronel no exército argentino e general peruano). Brandsen, com o 1º regimento (680 homens), lançou-se contra o quadrado do 4º de caçadores; os coronéis Paz (2º regimento, 540 homens) e Pacheco (3º regimento, 564 homens) contra os dos 3º e 27º. Essa carga foi repelida com perda dos argentinos, caindo mortos, junto aos quadrados brasileiros, o general Brandsen e o tenente-coronel Bezares (do 2º regimento).[8] A brigada de Araújo Barreto, levando à sua frente o general Sebastião Barreto, perseguiu os fugitivos.[9] Isto se passava às 11h.[8]
Pouco depois, à esquerda dos brasileiros, os dragões orientais (coronel Servando Gómez) e o esquadrão de couraceiros (tenente-coronel Anacleto Medina) atacavam de flanco e destroçavam o corpo de voluntários do barão de Cerro Largo, que, envolvido com os orientais, correu sobre os 13º e 18º batalhões de caçadores do próprio Brasil.[8] O general Calado formou com estes um só quadrado e viu-se forçado a fazer fogo sobre amigos e inimigos. Aí caiu mortalmente o barão de Cerro Largo.[8] As brigadas de cavalaria Barbosa Pita e Tomás da Silva foram levar a notícia do seu revés à guarda da bagagem. Já então numerosos esquadrões aliados apareciam nos dois flancos do exército brasileiro, dirigindo-se para a retaguarda, e ameaçando envolver a força brasileira. “Os fugitivos do barão de Cerro Largo, os lanceiros do Uruguai (guaranis) e os republicanos, todos à mistura, caíram sobre a bagagem e o parque e tudo roubaram, levando depois o inimigo as carretas de bagagem e o parque para dentro de um banhado” (barão de Caçapava, Batalha do Rosário).[8]
As duas brigadas de infantaria brasileiras continuavam a repelir as cargas de cavalaria dos aliados.[8] Quatro peças perdidas (uma delas na derrota do corpo de voluntários, três na carga dos lanceiros do coronel Olavarria) foram logo retomadas pelo 5º regimento (tenente-coronel Filipe Néri) e pelo 20º de milícias (coronel J. J. da Silva). Às 12h30, o coronel Lavalle, à frente do 4º regimento (couraceiros) e dos Colorados de Conchas, caiu sobre a brigada Egídio Calmon, composta do 1º regimento de 1ª linha (297 homens) e do 24º de milícias (134 homens, quase todos guaranis). Este último, morto o comandante, foi lançado fora do campo de batalha.[8]
O general Sebastião Barreto, com a 2ª brigada de cavalaria e o 21º de milícias, a cuja frente ia o coronel Bento Gonçalves, acudiu aos restos do 1º regimento e perseguiu a parte contrária até o alto de suas posições. O 39º de milícias (tenente-coronel Calderón), que fazia parte da brigada de Bento Gonçalves, já tinha abandonado o campo de batalha: segundo alguns, porque fora cortado;[8] segundo o barão de Caçapava e Elisiário Brito, porque aquele coronel Bento Gonçalves da Silva ordenara a Calderón que seguisse para o Jaguarão.[8] Bento Gonçalves da Silva e Bento Manuel Ribeiro já eram por esse tempo caudilhos influentes no Rio Grande do Sul, e o governo e os generais fechavam os olhos aos seus atos de indisciplina.[8] A última carga da cavalaria argentina contra a 1ª divisão brasileira foi comandada pelo coronel Paz, e foi repelida (o boletim argentino diz o contrário, mas o general La Madrid confirma as descrições brasileiras, em suas 'Observações sobre as Memórias Póstumas do General Paz', p. 256: 'A carga comandada pelo general Paz nesta batalha foi rechaçada e ele se viu obrigado a retirar-se a uma longa distância').[8]
Com o destroço do corpo de voluntários e do 24º de milícias, a retirada do 39º e as grandes perdas sofridas pelo 1º regimento, estando perdidos os carros de munições e tendo a cavalaria argentino-oriental alcançado a retaguarda e incendiado o campo,[10] o marquês de Barbacena ordenou, às 13h, que a 1ª divisão voltasse do vale, onde se achava, para a posição que ocupava primitivamente. Às 14h, o marquês de Barbacena fez soar então o toque de retirada. Alvear manda tocar fogo na mata que cerca o local da luta.
Juvêncio Saldanha Lemos salienta que além da ação da cavalaria republicana nos flancos, a eficácia da artilharia republicana (ao contrário da artilharia brasileira, à exceção das peças do tenente Emílio Mallet, que ficou atirando até o fim), bem postada nas elevações ("O inimigo procurou a sua formatura em conveniente altura a cavaleiro de nossa frente, conservando sua artilharia em lugares mais elevados e nas quebradas das coxilhas, que lhe ficaram à retaguarda e invisíveis por nós no primeiro encontro"; descrição feita pelo Marechal Lima e Silva, o qual participou na batalha)[11] e fora do alcance das armas brasileiras, também contribuiu para a decisão da retirada.[12] Não obstante a eficácia da artilharia republicana, assim como as sucessivas cargas da cavalaria aliada, a infantaria brasileira resistiu e retirou-se sem ter sido derrotada. Nas palavras do historiador argentino Baldrich: "Ningún cuadro de infanteria (brasileira) fué roto, lanceado ni sableado".[13]
O Exército brasileiro acampou, à meia-noite, no Passo do Cacequi, conduzindo toda a sua artilharia, menos uma peça, que foi abandonada durante a marcha, por ter as rodas quebradas; no dia seguinte (21), prosseguiu a retirada para o Passo de São Lourenço, no Jacuí, onde chegou a 2 de março, ficando em São Sepé parte da cavalaria, com o general Barreto. O Exército argentino-oriental não incomodou essa retirada e na mesma tarde de 20 contramarchou, indo acampar no Passo do Rosário, onde deixava suas bagagens; apenas o general Lavalleja, com dois mil homens de cavalaria, acompanhou de longe o exército brasileiro, até às 18h30, sem disparar um tiro.[8]
O Exército Imperial pôde se reagrupar dias depois na retaguarda. Os cativos feitos por argentinos e uruguaios vieram sobretudo das unidades que formavam as alas das forças sob Barbacena.[4]
A vitória
A batalha durou onze horas. O fim dessa batalha, certamente não significou o fim dos conflitos. Mas o resultado, apesar de vista a vitória pelos argentinos e uruguaios, devido ao fato de os brasileiros se retirarem do campo de combate, ainda suscita controvérsia. A vontade brasileira não venceu, mas também a sua oponente não triunfou, visto que o interesse declarado era o de anexar a província cisplatina às Províncias Unidas e retomar o vice-reinado de Buenos Aires.[14][7]
Os republicanos encontraram uma partitura, e a levaram como troféu. Alegaram que Dom Pedro I teria mandado compor a Marcha da Vitória para comemorar o sucesso brasileiro. Os argentinos rebatizaram a melodia de Marcha de Ituzaingó e desde então tocam a música em todas as cerimônias oficiais do presidente da república, sendo um dos atributos do próprio cargo.[carece de fontes?]
O terrestre e o naval
De todo modo, o Brasil seguiria com o domínio naval, já que logo em seguida, com a batalha de Monte Santiago, as ações navais argentinas ficaram limitadas à guerra de corso. Montevidéu e Colônia do Sacramento seguiam sob o controle do Brasil. A supremacia naval foi decisiva, pois sem controle naval as Províncias Unidas não tinham meios para vencer o conflito.
"O exército está completamente desprovido de meios para sitiar a Montevidéu de maneira mais eficaz que pelo bloqueio terrestre, método que a experiência tem demonstrado ser infrutífero, enquanto existir o predomínio dos brasileiros no mar. (...) Esta guerra é, em sua essência, uma guerra naval e o domínio da Banda Oriental e de Montevidéu ainda assim não significariam nenhuma vantagem para Buenos Aires, enquanto o bloqueio naval puder ser mantido pelo inimigo". Ponsonby a Canning[15]
"Ambas vitórias podem contribuir para acelerar a conclusão da desejada paz; não obstante, direi a você francamente que, não vendo em nenhuma dessas batalhas caráter de decisivas, temo muito que, se o imperador conheça - o que já deve - o estado de nossos recursos pecuniários e, mais do que tudo, o de nossas províncias, venha ele resistir a concluir a paz e, sem mais do que prolongar a guerra por um ano, venha nos colocar em uma situação muito crítica".[16]