Sua homologação foi condicionante da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte e tem sofrido historicamente forte pressão do desmatamento, sendo a terra indígena mais devastada cumulativamente no Brasil,[2] além de ameaças de violência e ocupação por cerca de 3 mil não indígenas no território.[3]
Histórico
Desde os anos 1960, o povo Arara se estruturava politicamente e economicamente de forma autônoma, sem ter contato voluntariamente com não indígenas, até o governo brasileiro iniciar as obras da Rodovia Transamazônica e deslocá-los para outras localidades, já que o empreendimento cortou parte do território deste povo indígena.[4][5] Nas duas décadas seguintes, o governo federal realizou um processo de incentivos fiscais e de financiamento com a finalidade de promover a ocupação da Amazônia, o que propiciou um avanço do desmatamento, garimpo, roubo de madeira ilegal, além do desenvolvimento agrícola e pecuário da região dos povos Arara.[1][4] Assim, a FUNAI criou a Frente de Atração Arara em 1970, a qual possuiu o intuito de controlar os conflitos decorrentes dessa colonização da região.[1]
No ano de 1985, a área da terra indígena foi interditada pela FUNAI para aprofundar os estudos referentes à demarcação do território. Porém, apenas em 1987 as comunidades que residem hoje na TI Cachoeira Seca foram contactadas oficialmente pelo órgão indigenista.[4]
Em 1989, técnicos da FUNAI iniciaram os trabalhos de identificação e demarcação do território indígena, sendo este composto por duas etapas. Primeiro, foi feito o mapeamento da região utilizada pelos indígenas para estabelecerem seus locais sagrados, roças e pontos de caça e pesca. Depois, foram realizados trabalhos de localização de possíveis invasores e suas benfeitorias, passo necessário para conduzir as propostas de demarcação da terra.[6]
No dia 13 de março de 1991, o Ministério Público Federal ajuizou uma ação de reintegração de posse contra a indústria madeireira Bannach, por retirada ilegal de madeira no território indígena interditado pela FUNAI desde 1985. No mês seguinte, a Justiça Federal expediu o mandato de reintegração de posse, de forma que oficiais de justiça e a Polícia Federal foram cumpri-lo. No entanto, de acordo com o órgão indigenista, a madeireira Bannach não cumpriu o mandato, realizando apenas a interrupção de suas operações na época.[7][8]
Em 21 de janeiro de 1993, a Terra Indígena Cachoeira Seca é declarada oficialmente pelo Ministério da Justiça com 760 mil hectares, sendo o território interligado com a Terra Indígena Arara.[9] No entanto, essa medida desagradou empresas e órgãos municipais da região, como os prefeitos de Altamira, Uruará e Rurópolis. Assim, a partir desses eventos, um antropólogo assessor do Ministério Público Federal elaborou um parecer contestando a área demarcada do território e a necessidade de interligação com a TI Arara. Tal parecer embasou uma visita do procurador da República e Coordenador de Defesa de Direitos e Interesses Indígenas do MPF, Wagner Gonçalves, para a região que, por sua vez, concluiu em julho do mesmo ano pela ilegalidade da portaria que demarcou a Terra Indígena Cachoeira Seca.[8][10]
No ano seguinte, a FUNAI busca a resolução de novo laudo antropológico, contestando as alegações realizadas pelas autoridades no ano anterior. No entanto, os grupos econômicos contrários à demarcação do território, prosseguiram na tentativa de anular completamente a portaria de 1993, entrando com cinco mandados de segurança no Superior Tribunal de Justiça (STJ), dos quais apenas dois foram acatados. Assim, em 1997 o STJ concede um dos mandados de segurança e anula completamente a portaria declaratória de 1993, baseado na fragilidade dos estudos que subsidiaram o aumento do território indígena e da necessidade de participação de outro grupos envolvidos na demarcação.[8][9][10]
Em 2004, a FUNAI inicia novos estudos com a finalidade de identificação e delimitação do território, resultando em uma proposta de demarcação de cerca de 734 mil hectares. A proposta é aprovada em 2008 e nova portaria de delimitação é assinada.[9]
Apenas no dia 5 de abril de 2016, no entanto, a Terra Indígena Cachoeira Seca foi oficialmente homologada, iniciando assim o processo de regularização do território e desintrusão dos não indígenas por meio do reconhecimento das ocupações de boa-fé e pagamento pelas benfeitorias.[5]
Apesar do processo de homologação ter sido realizado, a regularização fundiária não foi concluída em definitivo, restando no território milhares de ocupantes não indígenas e amplo avanço do desmatamento no território.[11]
Desmatamento
De acordo com levantamento da Frente de Proteção Etnoambiental do Médio Xingu, a Terra Indígena possuía taxa de desmatamento de cerca de 500 hectares por ano no período de início da construção da rodovia Transamazônica e passou para 2.400 hectares por ano em 2004. Esse ritmo segue a taxa de ocupação do território por não indígenas que passou de 311 ocupações em 1992 para 1.171 em 2011.[9]
Já segundo os dados do INPE, a terra indígena perdeu cerca de 368 quilômetros quadrados de floresta apenas entre 2008 e 2020,[12] atingindo um total de 697 quilômetros quadrados desmatados até o ano de 2022.[10] Também, a TI apareceu entre os cinco territórios indígenas mais desmatados entre 2019 e 2022 de acordo com os levantamentos anuais de desmatamento do Mapbiomas.[13][14][15][16]
Segundo relatório do Instituto Socioambiental, até o ano de 2014 cerca de R$400 milhões já haviam sido retirados de forma ilegal em madeira da TI, sendo principalmente ipês, jatobás e angelim-vermelhos, utilizados em indústrias na região Sul e Sudeste do Brasil.[17]
Em 2021, a Associação Indígena do Povo Arara da Cachoeira Seca (Kowit) lança a campanha Guardiões do Iriri, com o intuito de formar uma rede de apoio para defender o território e reivindicar a retirada dos não indígenas pelas autoridades competentes.[11][12]
Uma série de ações integradas foram deflagradas pelo Ibama a fim de combater o desmatamento na região. Em 2022, a Operação Guardiões do Bioma apreendeu cerca de $2 milhões de multa por exploração ilegal de madeira em 500 hectares do território indígena, além de apreender cerca de mil bovinos criados ilegalmente.[18] No ano seguinte, nova operação do Ibama com a Polícia Federal, denominada Massaranduba, apreendeu e destruiu equipamentos utilizados no desmatamento ilegal na região, tendo como suspeito um vereador da cidade de Placas.[19]
↑Relatório Anual de Desmatamento 2019 – São Paulo, SP – MapBiomas, 2020 – 49 páginas. Disponível em https://alerta.mapbiomas.org/relatorio. Acesso em 23/09/2023.
↑Relatório Anual de Desmatamento 2020 – São Paulo, SP – MapBiomas, 2021 – 93 páginas. Disponível em https://alerta.mapbiomas.org/relatorio. Acesso em 23/09/2023.
↑Relatório Anual de Desmatamento 2021 – São Paulo, SP – MapBiomas, 2022 – 126 páginas. Disponível em https://alerta.mapbiomas.org/relatorio. Acesso em 23/09/2023.
↑Relatório Anual de Desmatamento 2022 – São Paulo, SP – MapBiomas, 2023 – 125 páginas. Disponível em https://alerta.mapbiomas.org/relatorio. Acesso em 23/09/2023.