O bairro da República, em São Paulo, carrega um nome que homenageia a transformação política que o Brasil vivenciou em 1889, com a proclamação da República, marcando o fim do regime monárquico.[3] A Praça da República, um dos principais marcos do bairro, simboliza essa transição histórica e tem sido palco de inúmeros eventos cívicos e culturais ao longo dos anos.[4] As vias da República, como a Avenida Ipiranga e a Avenida São Luís, refletem o rico patrimônio cultural e histórico da cidade, frequentemente homenageando eventos e figuras significativas da história brasileira.[2]
As origens do bairro remontam à primeira expansão efetiva do núcleo principal do município, a partir de sua colina central, o chamado Centro Velho, que hoje ocupa o distrito da Sé, para o oeste do Rio Anhangabaú, atual Vale do Anhangabaú.[3] Essa expansão ocorreu especialmente durante a segunda metade do século XIX e as primeiras décadas do século XX, em um período de rápido crescimento urbano em São Paulo.[4] Inicialmente ocupada por chácaras, a área rapidamente se transformou em um centro urbano dinâmico, atraindo imigrantes e comerciantes devido à sua proximidade com o centro econômico da cidade. O loteamento foi cuidadosamente planejado para abrigar edifícios residenciais e comerciais, muitos dos quais ostentam a arquitetura neoclássica e art déco, características da época.[4] A região do atual bairro da República era então chamada de Centro Novo, em oposição ao Centro Velho.[3]
A história do bairro começa com o Largo da Memória, originalmente conhecido como "Piques", que remonta a 1814, quando o governo provisório da Capitania de São Paulo, liderado por figuras como o bispo D. Mateus de Abreu, encarregou o engenheiro militar Daniel Pedro Müller da construção da Estrada dos Piques e um chafariz. Este local servia como ponto de parada para tropeiros e mercado de escravos, tornando-se um marco urbano com a construção do obelisco "à memória do zelo do bem público".[4]
Durante o século XIX, o Largo da Memória foi uma das "portas de entrada" da cidade, localizado no encontro das rotas para Sorocaba, Pinheiros, Anastácio e Água Fria, e atraía moradores, viajantes e escravos pela água potável fornecida pelo chafariz.[5] No final do século, uma figueira conhecida como Figueira brava tornou-se um marco do local. Em 1919, Washington Luís contratou Victor Dubugras e José Wasth Rodrigues para projetar a reforma do largo, introduzindo elementos neocoloniais e preservando o obelisco e a figueira.[6]
A Ladeira do Acu, que posteriormente teve uma pequena ponte construída para permitir a continuidade de seu traçado além das águas do rio, foi um importante desenvolvimento na área.[4] Este caminho foi batizado de Rua de São João Batista, correspondendo hoje ao trecho central da Avenida São João, um dos principais eixos viários da região central do município. [2][7]
Na transição entre os séculos XIX e XX, a Praça da República era uma vasta região, mas a construção do Viaduto do Chá em 1892, que ligava o Centro Velho ao novo quadrilátero formado pelas ruas entre a Xavier de Toledo, a Avenida Ipiranga, Avenida São João e a São Luiz.[2] Dois anos depois, foi fundado o Colégio Caetano de Campos, a primeira escola normal da capital, criada para formar professores para o ensino primário.[8] O prédio, projetado pelo arquiteto Ramos de Azevedo, funcionou como instituição de ensino até 1978, quando os alunos foram transferidos para outros locais.[4] Desde então, o edifício é tombado pelo patrimônio histórico e serve como sede da Secretaria Estadual da Educação.[3]
A Praça da República foi inaugurada pela condessa Claudia Cornélia Regina, esposa do Visconde de Sepetiba, em 1905. O bairro também é conhecido por seus marcos históricos, como o Theatro Municipal de São Paulo, inaugurado em 1911 e idealizado por Ramos de Azevedo junto com os italianos Cláudio Rossi e Domiziano Rossi, foi concebido com traços renascentistas e barrocos, inspirado na Ópera de Paris.[9] Tornou-se palco de grandes apresentações culturais e sociais da cidade, incluindo a Semana de Arte Moderna de 1922. E a Biblioteca Mário de Andrade, fundada em 1925, foi a primeira e principal biblioteca pública da cidade, com um acervo de mais de 3 milhões de volumes, sendo um tesouro da região.[10]
O bairro tem grande importância histórica, pois foi palco da Revolução Constitucionalista de 1932, um movimento contra o governo do presidente Getúlio Vargas.[4] Nos arredores da praça, em 23 de maio daquele ano, os jovens Mario Martins de Almeida, Euclides Miragaia, Dráusio Marcondes de Sousa e Antônio Camargo de Andrade foram assassinados em frente à sede do Partido Popular Paulista, na Rua Barão de Itapetininga. Após a morte desses quatro estudantes, surgiu o movimento M.M.D.C. (Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo), que se tornou um dos marcos do período.[3] Mais de 50 anos depois, a Praça da República foi palco das manifestações das “Diretas Já!” em 1984.[11]
Projetos arquitetônicos icônicos surgiram nas décadas seguintes, como o Edifício Copan, iniciado em 1951, e o Edifício Itália, cuja construção começou no início da década de 1960 e foi concluída em 1965, simbolizando a ascensão social e econômica dos imigrantes italianos.[12][13][14]
O Palácio Anchieta, sede da Câmara Municipal de São Paulo, é outro marco importante. A luta por uma sede digna para o legislativo paulistano remonta ao século XVI, mas só em 1969 o Palácio Anchieta foi inaugurado oficialmente.[3] Localizado no Viaduto Jacareí, o edifício é um reflexo da contínua evolução do bairro da República como centro político e cultural. Outros marcos incluem o Palácio dos Correios, as avenidas Ipiranga e São João, e o Largo do Arouche. Esses elementos compõem a rica tapeçaria histórica e cultural do bairro da República, tornando-o um dos locais mais emblemáticos de São Paulo.[15] A importância cultural, histórica e arquitetônica do Largo da Memória e do bairro foi reconhecida com o tombamento como patrimônio histórico estadual em 1975 e municipal em 1991.[16]
Atualidade
Na atualidade, o Copan é um dos cartões postais de São Paulo, considerado o maior complexo residencial do Brasil e da América Latina, com 1.160 apartamentos e um centro comercial no térreo.[17] O Edifício Itália,[18][19] o quarto prédio mais alto de São Paulo, oferece vistas impressionantes da cidade a partir do Terraço Itália.[20] O cruzamento das avenidas Ipiranga e São João, imortalizado na música “Sampa” de Caetano Veloso,[21] continua a ser um ponto de referência cultural e gastronômico, com locais icônicos como o Bar Brahma e o restaurante Sujinho.[22]
Hoje, a área central da República continua a atrair investimentos, especialmente através do PIU (Projeto de Intervenção Urbana) Central, que visa aumentar a oferta de moradia no centro histórico.[22] O bairro é um símbolo da diversidade e da vida urbana de São Paulo, abrigando uma feira de artesanato diária e diversos locais turísticos. A esquina onde está o Bar e Lanches Estadão é um ponto de encontro famoso, conhecido por seu sanduíche de pernil.[23]
O Palácio dos Correios, outro marco histórico na região, continua a funcionar como uma importante instalação postal e de serviços, enquanto sua arquitetura neoclássica atrai visitantes interessados na história e no patrimônio arquitetônico da cidade.[24] O Largo do Arouche, uma praça tradicional da cidade, foi revitalizado e tornou-se um local popular para feiras de flores e eventos culturais, além de ser citado na famosa sitcom "Sai de Baixo", que contribuiu para sua notoriedade.[25]
A Galeria do Rock, oficialmente conhecida como Centro Comercial Grandes Galerias, é um dos pontos turísticos mais peculiares de São Paulo.[2] Inaugurada em 1963, a galeria é um reduto de cultura alternativa, abrigando lojas de discos, moda, e acessórios voltados para diversas tribos urbanas, como os punks e rockeiros. Após um período de declínio na década de 1970, a galeria se reinventou e hoje é um vibrante centro de diversidade cultural, atraindo jovens de todas as partes da cidade.[22]
Apesar de suas muitas atrações, o bairro da República enfrenta desafios urbanos comuns aos grandes centros, como questões de segurança e infraestrutura.[26] A prefeitura de São Paulo busca revitalizar o centro histórico através do PIU (Projeto de Intervenção Urbana) Central, que visa aumentar a oferta de moradia e atrair novos moradores para a área. No entanto, as transformações urbanas ainda enfrentam resistência e dificuldades, especialmente em relação aos problemas sociais que persistem na região.[22]
Turisticamente, a República continua a ser um dos destinos mais procurados em São Paulo, graças à sua rica tapeçaria de ofertas culturais, gastronômicas e históricas. Locais icônicos como o Edifício Copan e o Edifício Itália não apenas definem o horizonte da cidade, mas também oferecem experiências únicas, como vistas panorâmicas e eventos culturais, reforçando o bairro como um símbolo da diversidade e vitalidade de São Paulo.[27]
↑Roberto Pompeu de Toledo (2003). A Capital da Solidão. Uma história de São Paulo das origens a 1900. Rio de Janeiro: Editora Objetiva. pp. págs. 302–304. ISBN85-7302-568-9
↑Ribeiro, Tatiane (30 de abril de 2014). «Edifício Copan». www.cidadedesaopaulo.com. Consultado em 26 de abril de 2017. Arquivado do original em 26 de abril de 2017