O Direito das Mudanças Climáticas no Brasil

O Direito Ambiental das Mudanças Climáticas “é resultado da preocupação dos teóricos e operadores do Direito com as consequências naturais dos atos praticados pelos homens, e que tendem a causar modificação nas condições climáticas em todo o Globo”. [1]

É de fácil percepção que o clima do globo inteiro vem se alterando gradualmente ao longo dos anos, e que o que antes era tomado como mero sensacionalismo de ambientalistas radicais, hoje é percebido como uma realidade que preocupa a todos. Portanto, cabe esclarecer, que a preservação ambiental deixou de ser uma questão do centro do mundo (Europa e América do Norte), e passou a ser um problema que também envolve as chamadas “periferias do mundo”. Embora as mudanças climáticas tenham sua origem na atmosfera, seus efeitos acabam por se estender por quase todos ecossistemas e recursos ambientais, como por exemplo a biodiversidade, as águas, e o solo; sendo, assim, problemas que colocam a vida na terra em risco.

Inicialmente, cumpre destacar o conceito de atmosfera, a fim de que o tema que será tratado possa ser mais bem compreendido: essa consiste em uma camada de gases que envolve o planeta [2], e conforme o artigo 3º da Lei n.o 6.938/81 é um dos recursos ambientais do mesmo.

A atmosfera não é passível de domínio, mas por ser um recurso ambiental é bem de interesse difuso, de forma que tanto o Poder Público – incluindo-se aqui, no caso brasileiro, a União, os Estados e os Municípios, tendo em vista a competência concorrente estabelecida pelo artigo 24, inciso VI da CF –, quanto a sociedade tem obrigação de protegê-la.

Além de conter gases fundamentais para a vida humana, vegetal e animal, a atmosfera também é responsável por aprisionar parte do calor do Sol, garantindo uma temperatura média de 15ºC, e impedindo que nosso planeta seja um ambiente gelado e inabitável. Por isso, os principais gases componentes da atmosfera são intitulados de “Gases de Efeito Estufa” (GEE). O efeito estufa é, destarte, a princípio um fenômeno natural.

Todavia, a partir da Revolução Industrial, esses gases (principalmente o CO2, CH4 e N2O) passaram a ser excessivamente liberados, ocasionando relevantes alterações no sistema climático, que afetam todo o planeta. Algumas consequências do aumento da temperatura média do planeta – o “aquecimento global”- são a ocorrência de eventos naturais, como furacões e tempestades, e o aumento do nível do mar. Esse ainda quadro se agrava com a destruição da camada de ozônio pela emissão do CFC, uma vez que esta tem o papel de absorver os raios solares ultravioleta.

Diante desse novo cenário, notou-se que os problemas ambientais são interconectados. O aquecimento global, por exemplo, que surge com a liberação excessiva dos gases de efeito estufa, leva à redução da biodiversidade, contribuindo, com isso para a degradação do solo. Igualmente, tem impacto sobre a população rural, devido à falta das chuvas, e sobre a urbana, que sofre com as enchentes. Com isso, uma abordagem global e geral dos problemas ambientais se tornou necessária.

As Leis e Resoluções brasileiras

Partindo-se do pressuposto que se trata de uma questão verdadeiramente nova, esta acaba por ainda não ser efetivamente disciplinada no âmbito jurídico, e é natural que haja na comunidade de juristas certa perplexidade acerca do papel do Direito na coerção das atividades que impactam o equilíbrio do clima. Afinal, teria o Poder Judiciário qual função neste contexto?

Resoluções do Brasil quanto à poluição atmosférica

O Brasil é o quinto maior emissor de gases-estufa do planeta e o desmatamento, no Brasil, responde por 75% das suas emissões. Deste modo, portanto, 3% dos gases que causam o efeito estuda na Terra são provenientes diretamente de queimadas de florestas brasileiras. As consequências da poluição atmosférica são gravíssimas, uma vez que o excesso de poluentes no ar causa diversas doenças à população, bem como põe em risco a fauna e a flora local. Foi o caso da cidade de Cubatão (SP) onde se localiza um centro petroquímico, e que em 1970 foi considerada a mais poluída do mundo, levando a população a adquirir diversas doenças, dentre as mais conhecidas: o número de nascimentos anormal de fetos anencefálicos.

Além disso, devido à chuva ácida causada pelos altos índices de enxofre no ar a vegetação da Mata Atlântica na cidade foi destruída, colocando em risco a Serra do Mar, que sem vegetação tendia a desmoronar a qualquer momento. Tal quadro só foi revertido devido à implantação da legislação ambiental e ao clamor da sociedade para que a situação se modificasse.

Tendo em vista o risco que a poluição do ar traz à vida no planeta, além dos crimes contra a atmosfera estarem previstos no artigo 54 da Lei de Crimes Ambientais, foram criadas diversas Resoluções que buscam dirimir a mesma:

a) Resolução CONAMA n.o 5 de 15.06.1989: institui o Programa Nacional de Controle da Qualidade do Ar (PRONAR), que busca o desenvolvimento econômico e social do país de forma ambientalmente segura, limitando os níveis de emissão de poluentes. A Resolução CONAMA n.o 3 de 28.06.1990 complementou a n.o 5, definindo os padrões de qualidade do ar.

b) Resolução CONAMA n.o 18 de 06.05.1986: institui o Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores (PROCONVE), tendo em vista a contribuição destes para a emissão de poluentes. Em complemento, a Lei n.o 8.723/93 estabeleceu limites e prazos para os fabricantes de motores, veículos automotores e combustíveis observares no desenvolvimento de suas atividades. O PROCONVE ainda foi complementado pelas Resoluções n.o 315/02, 403/08 e 415/09.

c) Resolução CONAMA n.o 418 de 25.11.2009: institui critérios para a elaboração de Planos de Controle de Poluição Veicular (PCPV), com fins de implantação de Programas de Inspeção e Manutenção de Veículos em Uso.

Atuação do Judiciário e Mudanças Climáticas

O Poder Judiciário tem a disposição diversas leis que tratam sobre as mudanças climáticas, e diante do cenário que se expõe na atualidade, tem o dever de coibir – por meio da aplicação de normas cíveis e penais – a destruição do ecossistema brasileiro, que por ventura irá trazer consequências desastrosas para a manutenção da vida em nosso planeta.

O juiz deve sempre analisar os casos ambientais isoladamente, a fim de averiguar quais as consequências climáticas que irão incidir diante de determinada transgressão do ecossistema. Há, portanto, hoje a necessidade de se alterar a visão unificada de direito das mudanças climáticas do juiz, para que este possa perceber que em atos de agressão à natureza, é uma preocupação de todos, e que a aplicação de forma correta das leis de mudanças climáticas, é um grande passo para a consolidação do Direito das Mudanças Climáticas no âmbito Jurídico.

As mudanças climáticas e a legislação internacional

Após a Revolução Industrial as relações do homem com o meio ambiente se transformaram radicalmente, pondo em risco a saúde dos seres humanos e do próprio planeta. Durante muito tempo a comunidade internacional se viu sem uma legislação que regulasse a utilização dos recursos ambientais pelo homem, o que estabelecesse punições em casos de abusos e infrações. Foi a partir do século XX que começaram a se delinear as primeiras linhas diretivas de proteção do meio ambiente, tendo sido realizados diversas reuniões internacionais, visando a estabelecer protocolos e acordos entre as nações, para tentar diminuir os impactos ambientais.

Deve-se ressaltar a importância que o Caso Trail Smelter[3] teve para a legislação ambiental, pois foi a primeira manifestação sobre o direito internacional do meio ambiente, a qual definiu que “nenhum Estado tem o direito de usar ou de permitir o uso de seu território de tal modo que cause danos em razão do lançamento de emanações no ou até o território de outro.” [4]

Com o passar dos anos diversas convenções internacionais foram adotadas visando a proteger o meio ambiente sob diversos aspectos. Merece destaque a Conferencia de Estocolmo, a qual definiu regras para que a atividade econômica não causasse danos irreparáveis ao meio ambiente, tendo sido formulada a Convenção de Estocolmo que se destacou “em razão do enfoque conferido ao tema, pois o núcleo da atenção não se restringia a um recurso ambiental, ou a uma espécie em perigo, mas abordava o meio ambiente como um todo, objeto de preocupação de toda a humanidade”. [5]

Em relação as questões das mudanças climáticas, a Conferencia do Rio de Janeiro sobre o meio ambiente e o desenvolvimento foi um marco para a história da legislação ambiental internacional, pois representou um consistente processo de montagem de uma ordem jurídica ambiental, haja vista que entre 1972 (ano da convenção de Estocolmo) e 1992 (ano da conferencia do RJ) os níveis de poluição atmosférica haviam aumentado drasticamente e nada efetivamente havia sido feito. Foi estabelecida uma convenção quadro sobre mudança do clima, a qual estabeleceu estratégias de combate ao efeito estufa e á destruição da camada de ozônio que não estavam definidas pelo Protocolo do Montreal. Seu objetivo era evitar interferências antropogênicas perigosas no sistema climático”. Incluiu-se na pauta de metas que os países industrializados mantivessem suas emissões de gases estufa nos níveis de 1990. Por fim, estabeleceu-se o princípio da responsabilidade comum diferenciada, que significa que todos os países têm a responsabilidade de proteger o clima, mas o norte deve ser o primeiro a atuar. [6]

Diante da crescente problemática da destruição da camada de ozônio, foi realizada a Convenção de Viena para a Proteção da Camada de Ozônio em 1985, tendo sido estabelecido o Protocolo de Montreal sobre as substâncias que destroem a camada de ozônio. Restou estabelecido que os países deveriam diminuir o consumo de SDOS a partir de um princípio das obrigações comuns diferenciadas, ou seja, os países desenvolvidos que historicamente tiveram maior consumo de tais substâncias deveriam contribuir financeiramente para apoiar a implementação de medidas para eliminar essas substâncias em países em desenvolvimento. [7] Por isso, e 1990 foi instituído o Fundo Multilateral para Implementação do Protocolo de Montreal (FML), administrado por um Comitê Executivo e abastecido por países desenvolvidos.

Por fim, merece grande destaque o Protocolo de Kyoto, acordo fechado durante a terceira Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 1997. Estabeleceu metas de redução das emissões de dióxido de carbono, que é responsável por 70% das emissões relacionadas ao aquecimento global, e outros gases causadores do efeito estufa. Para que o Pacto entre em vigor, será necessário que ele torne lei em pelo menos 55 países, que somem ao todo, 55% das emissões. No entanto, os Estados Unidos ainda não apoiaram o protocolo, o que gera um grave empasse mundial, na medida em que são os maiores poluidores e sem a sua aderência, o protocolo tem sua validação parada. [8]

Conclusão

Com os avanços e desenvolvimentos tecnológicos a intervenção humana no meio ambiente tem se tornado cada vez mais intensa e perigosa. Os recursos energéticos estão correndo risco de se esgotarem e a poluição tem tomado níveis alarmantes. Pudemos notar que a comunidade internacional tem adotado grandes esforços para tentar diminuir os impactos que o homem vem causando no mundo, numa tentativa de tentar amenizar os prejuízos que poderão vir a surgir para as gerações futuras. Neste contexto de convenções e tratados internacionais visando a proteção ambiental o Brasil também é uma série de medidas no âmbito nacional para que se proteja e preserve o meio ambiente e nossos recursos ambientas. No entanto, é necessário que políticas mais incisivas e grandes pressões internacionais sejam tomadas para que de fato todos os países possam contribuir efetivamente para a proteção do meio ambiente.

Referências

  1. Direito Ambiental das Mudanças Climáticas – Ney de Barros Bello Filho. Revista de Direito Ambiental, volume 59, página 274 – Abril de 2010.
  2. A atmosfera é formada por 77% de gás nitrogênio, 21% de gás oxigênio, e 0,04% de dióxido de carbono, dentre outros gases
  3. Caso em que uma fundição localizada na fronteira do Canada e Estados Unidos lançava fumaça toxica e partículas solidas causando sérios danos a pessoas, animais e bens, inclusive no território americano. Prevalecia, até aquele momento, a noção de que “o Estado soberano não tinha nenhuma limitação de ordem jurídica ao permitir a utilização de seu território de forma como bem entendesse.” A sentença arbitral acabou por definir o princípio de que um Estado possui responsabilidade por danos ambientais que se estendem além de seus limites territoriais
  4. GRANZIERA, Maria Luiza Machado. Direito Ambiental. São Paulo, Ed. Atlas, 2014, p. 26.
  5. Idem, p. 34.
  6. «Cópia arquivada» (PDF). Consultado em 26 de agosto de 2014. Arquivado do original (PDF) em 24 de setembro de 2015 
  7. http://www.protocolodemontreal.org.br/eficiente/sites/protocolodemontreal.org.br/pt-br/site.php?secao=viena-montreal
  8. «Cópia arquivada». Consultado em 26 de agosto de 2014. Arquivado do original em 27 de agosto de 2014 
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