Lourenço Fernandes da Cunha (c. 1145 - Outubro de 1225-Outubro de 1228) foi um nobre e cavaleiro medieval do Reino de Portugal. Cerca do ano de 1214 mandou escrever o que é considerado o primeiro documento escrito em português, a chamada Notícia de Torto.[1][2]
Filiação
Foi filho de Fernão Pais da Cunha (1103 - c. 1180), 2.º Senhor da Honra da Cunha e 2.º senhor consorte de Tábua e de sua mulher Mor Uzbertiz.
Biografia
Segundo alguns historiadores[quem?] nasceu no solar da família, na antiga freguesia de São Miguel da Cunha, concelho de Braga, e criado em casa de Pedro Silvestre, na freguesia de São Tomé de Moimenta.
Em junho de 1171, com os pais já falecidos, sua irmã Elvira Fernandes, com a outorga de seus tios e primos de Coimbra, procedeu-lhe à venda, pela quantia de 40 morabitinos, do solar que possuía em freguesia da Cunha, local onde Lourenço se encontrava a fazer uma quinta com a respectiva torre senhorial. Este facto mostra que já era de maior idade e proprietário abastado.
Era um cavaleiro da Honra de Varzim (Honrra de Veracim), sistema feudal que floresceu na Europa do século XI e XII, com heranças mantidas juntas e administradas em conjunto, com caput no centro da Póvoa de Varzim (Villa Veracin), onde tinha o seu palácio e de seus filhos. Neto paterno de Paio Guterres da Cunha, que o conde D. Henrique reconheceu como Senhor de Varzim,[3] ganhou vários domínios pelo reino, o poder deste cavaleiro e por acreditar que a sua família conspirava contra o rei, levou D. Sancho a destruir-lhe a torre de Cunha, várias propriedades agrícolas em Cunha e Varzim, e capturou o Porto de Varzim, este último persistirá a ser uma questão entre a honra de Varzim e os réis portugueses até ao reinado de D. Dinis.[4]
Foi Cavaleiro Fidalgo e o 3.º Senhor da Honra da Cunha e o 3.º Senhor de Tábua de juro e herdade. O importante documento medieval denominado Notícia de Torto, escrito entre 1211 e 1216, que é o mais antigo documento particular datável conhecido escrito em português, apresenta-nos uma importante narrativa dos agravos que o nobre Lourenço Fernandes da Cunha sofreu às mãos de outros senhores.
Padroeiro das igrejas de Tábua e São Miguel da Cunha e dos mosteiros de São Simão da Junqueira, São Salvador do Souto e Santo Estêvão de Vilela, etc. Foi senhor de muitos bens espalhados pelo Minho, Douro e Beira Alta. Documentado desde 1171 e falecido entre 1225 e 1228. Documenta-se com sua mulher em 1202.
Ataque a Sevilha
Em 1176 Lourenço Fernandes, foi um dos Cavaleiros que acompanharam o infante D. Sancho I no ataque à cidade de Sevilha, detida pelos mouros. Lourenço procedeu nesta cidade ao saque do Bairro de Triana, tendo regressado a Portugal e aos seus domínios com os despojos.
Domínios
Com o seu casamento ocorrido com Sancha Lourenço de Macieira, Lourenço recebe importantes bens; fez numerosas compras, de que ainda existem 24 escrituras, recebeu doações de particulares e doações régias e ainda além disso procedeu a ocupações territoriais abusivas, todos estes factores levaram Lourenço a acumular uma vasta fortuna territorial, distribuída pelos concelhos de Barcelos, Braga e Póvoa de Varzim, Guimarães, Santo Tirso, Coimbra, Tábua, termos de Águeda e Vouga e a outras terras. Embora de forma mais concentrada nos concelho de Barcelos, Braga e Povoa de Varzim.
Foi quem em 1099 procedeu ao povoamento de Aver-o-Mar, freguesia da Póvoa de Varzim. As Inquirições reais de 1258 informam que Aver-o-Mar é "a terra é honra de Cavaleiros".
Foram os habitantes ou os cavaleiros que procederam à construção, por volta do século XV de uma capela dedicada a Nossa Senhora das Neves que actualmente é a padroeira da freguesia.
Manteve boas relações com o rei D. Afonso II de Portugal, que lhe veio a doar bens em na freguesia de Souto, concelho de Guimarães.
Este Gomes Lourenço aparece nas Inquirições do ano 1258 e do ano de 1290 com propriedades em São Paio de Figueiredo, concelho de Guimarães, em São Cristóvão de Rio Mau e São Miguel de Argivai, concelho de Póvoa de Varzim.[5]
Ataques de D. Sancho I
No documento «Mentio de malefactoria» ele queixa-se de o rei de D. Sancho I de Portugal lhe ter mandado “ermar 70 casais com cem homens de maladia e incendiar a quinta e casais” que tinha na freguesia de Cunha. Este documento leva à conclusão de que se tratava de um rico cavaleiro, a quem, na mesma altura, “tomaram 40 escudos, capacetes de ferro e muitas outras armas…capellos de ferro et multa alia arma”.
Esta perseguição por parte do rei exposta no «Mentio de malefactoria», deu-se nos fins do reinado de D. Sancho I, e depois do mês de abril de 1210. A torre de Cunha foi destruida. O rei ordenou a destruição de várias das suas propriedades em Varzim, incluindo 10 dos 17 casais de Varzim. O rei tomou a terra, destruiu as propriedades e expulsou os povoadores.[4]
Aproveitando-se destes acontecimentos, Lourenço Fernandes da Cunha e família foram sujeitos a uma série de roubos, violências por parte, de vários nobres, mas principalmente da parte dos filhos de D. Gonçalo Ramires, que possuía uma honra antiga na freguesia de Cunha, e que era seu conterrâneo e parente.
Não obstante estes acontecimentos, Lourenço conseguiu conservar e recuperar parte da fortuna, que acabou por deixar a esposa e aos filhos.
Falecimento
Embora não sejam conhecidos documentos de óbito os historiadores de deduzem que deve ter falecido entre Outubro de 1225 e Outubro de 1228, dado que em Outubro de 1225 aparece a fazer uma compra juntamente com a esposa, enquanto na segunda data, Outubro de 1228, é somente a esposa que aparece a fazer uma compra, não voltando Lourenço a intervir em qualquer outro documento conhecido.
Todos os filhos de Lourenço Fernandes foram fidalgos de fortuna e com influência, embora como é natural, houve uns que sobressaíram como foi o caso informado pelo Nobiliário do Conde D. Pedro; “D. Gomez Louremço foy muito honrrado e de gram fazemda e foy padrinho delrey Dom Dinis de Portugal” e “Egas Loureraço foy o melhor e mais honrrado de seus irmãaos”.
Casamentos e descendência
Casou por duas vezes, a primeira a 24 de Outubro de 1198 com D. Sancha Lourenço de Maceira, documentada nas Inquirições de 1258 e 1288, filha de Lourenço Gomes de Maceira,[6] de quem teve:
- Gomes Lourenço da Cunha, casado por duas vezes, a primeira com Teresa Gil da Arões e a segunda com Maria Martins do Vinhal;
- Egas Lourenço da Cunha, "o melhor e o mais honrado de seus irmãos", cavaleiro que teve participação destacada na conquista do Algarve (1249);[6]
- João Lourenço da Cunha, fundador e 1.º senhor do Morgado de Tábua, que deixou a seu irmão Vasco Lourenço;
- Maria Lourenço da Cunha, casou com Rodrigo da Nóbrega;
- Vasco Lourenço da Cunha (1210 -?), 2.º senhor do morgado de Tábua, casado com Teresa Pires de Portel;
- Mor Lourenço da Cunha, casou com Estêvão Lavandeira;
- Martim Lourenço da Cunha (?-?), casou (c. 1210 -?) com Sancha Garcia de Penha filha de Garcia Fernandes de Penha (1180 -?) e de Teresa Pires de Baião (1190 -?);
- Urraca Lourenço da Cunha (fundadora de um vínculo no ano de 1269 que, no século XVI, tinha como administrador Vicente Novais da Cunha[7] e depois passaria por sucessão para os senhores da honra de Barbosa),[8] casou com Martim Martins Dade, que foi alcaide-mor do Castelo de Santarém;
- Sancha Lourenço da Cunha, foi freira no Mosteiro de Vairão;
- Marinha Lourenço da Cunha;
- Domingos Lourenço da Cunha
O segundo casamento foi com:
Maria Martins do Vinhal (c. 1190 -?), de quem não teve descendência.
Fora do casamento teve:
- Vicente Lourenço da Cunha;
- Maria Lourenço da Cunha.
Bibliografia
- José Augusto de Sotto Mayor Pizarro, Linhagens Medievais Portuguesas - 3 vols, Universidade Moderna, 1ª Edição, Porto, 1999. vol. 2-pg. 351.
- Manuel José da Costa Felgueiras Gaio, Nobiliário das Famílias de Portugal, Carvalhos de Basto, 2ª Edição, Braga, 1989. vol. IV-pg. 144 (Cunhas).
- Manuel Abranches de Soveral, Ascendências Visienses. Ensaio genealógico sobre a nobreza de Viseu. Séculos XIV a XVII, Porto 2004, ISBN 972-97430-6-1
Referências
- ↑ Mattoso, José (abril de 2015). Identificação de um país : oposição - composição : ensaio sobre as origens de Portugal : 1096-1325 1a. edição ed. Lisboa: [s.n.] pp. 180 – 181. OCLC 906791584
- ↑ Ramos, Rui; Sousa, Bernardo Vasconcelos e; Monteiro, Nuno Gonçalo (29 de julho de 2014). História de Portugal. Lisboa: A Esfera dos Livros. (Edição do Kindle). p. 176.
Os mais antigos documentos não literários escritos em Português e que chegaram até nós são o testamento de D. Afonso II, de 1214, e a chamada Notícia de Torto, que não apresenta data, mas foi datada criticamente de 1214-1216
- ↑ Baptista de Lima, João (2008). Póvoa de Varzim - Monografia e Materiais para a sua história. [S.l.]: Na Linha do horizonte - Biblioteca Poveira CMPV
- ↑ a b Amorim, Manuel (2003). A Póvoa Antiga. [S.l.]: Na Linha do horizonte - Biblioteca Poveira CMPV
- ↑ de Cronologia, Diplomática Paleografia e Histórico-linguístico, P. Avelino de Jesus da Costa
- ↑ a b Freire, Anselmo Braamcamp (1921). Brasões da Sala de Sintra, Livro Primeiro. University of Toronto. Coimbra: Coimbra : Imprensa da Universidade. pp. 157, 407
- ↑ Cardoso, Augusto-Pedro Lopes. «Vicente Novais, o que veio rico da Índia». Armas e Troféus, Revista de História, Heráldica, Genealogia e Arte. Consultado em 21 de outubro de 2020
- ↑ Cardoso, Augusto-Pedro Lopes. «Um abade viajante do séc. XVI. Dom Manuel de Azevedo, senhor da honra de Barbosa». Armas e Troféus, IX série, Tomo 20, 2018: 445 - 446. Consultado em 18 de fevereiro de 2020