A Igreja da Ordem Terceira da Santíssima Trindade é um templo católico romano abandonado localizado no bairro de Água de Meninos, na Cidade Baixa, em Salvador, na Bahia. Construída como capela em 1733 e ampliada para o formato atual em 1739, a igreja foi abandonada pela Arquidiocese de São Salvador em 1990. O templo ficou fechado durante dez anos. Desde 2000, é ocupado por um grupo de moradores de rua conhecido como Comunidade da Trindade.
História
Em 1733, a Irmandade do Rosário e Santíssima Trindade arrendou um terreno da paróquia de Santo Antônio Além do Carmo para a construção de uma capela sob a invocação de Nossa Senhora do Rosário e da Santíssima Trindade.[1] Esse templo foi erguido na ladeira que dá acesso ao bairro de Água de Meninos; acredita-se que ainda existam restos desta primeira construção no local.[1] Em 1739, a Irmandade optou por construir uma igreja maior no local atual.[1] Em seu prospecto de 1800, Luís dos Santos Vilhena indica que a edificação era conhecida como Igreja do Rosário.[1] Nesse prospecto, a Igreja é apresentada ainda sem torres, sendo então uma capela da paróquia local.[1]
Em 1806, uma bula do papa Pio VII, extinguiu a Irmandade do Rosário e Santíssima Trindade, criando, em seu lugar, a Ordem Terceira da Santíssima Trindade e Redenção dos Cativos.[1] Em 1877, a Ordem obteve do governo da Bahia a doação do cemitério do Bom Jesus e terrenos anexos.[1] Em 1888, a Igreja foi consumida por um incêndio, que deixou apenas as paredes externas intactas.[1] Em 1968, a torre direita desmoronou.[1] Em 1990, foi realizada a última celebração eucarística no local e, logo em seguida, a igreja ficou completamente abandonada durante dez anos.[2]
Em 2000, o monge católico Henrique Peregrino organizou uma peregrinação a Salvador e colocou a Igreja da Trindade em seu roteiro.[2] Entretanto, ao chegar ao local, ele e os demais peregrinos encontraram o templo fechado.[2] Ele procurou o responsável pela igreja para "ver a possibilidade de abri-la para a oração" e "se poderíamos morar aqui para devolver o culto à Trindade e para acolher as pessoas de rua".[2] Segundo Peregrino, cerca de 100 pessoas são acolhidas todos os anos pela Comunidade da Trindade.[2] Desde 2007,[1] o grupo edita o jornal Aurora da Rua, que possui tiragem de 10.000 exemplares e é publicado a cada dois meses.[2] O jornal visa gerar renda para os moradores de rua.[2]
Características
A igreja, localizada na Avenida Jequitáia – próximo ao Mercado do Peixe de Água de Meninos – e acessada por uma escadaria, possui três naves e sua fachada conta com elementos rococó e neoclássico,[1][2] embora esta tenha se descaracterizado após o incêndio de 1888, reformas mal planejadas e executadas e pelo desabamento da torre direita em 1968.[3] Segundo informações do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC), o edifício foi "prejudicado pela inserção de elementos não condizentes como lajes de concreto nas galerias".[4] Já não possui mais janelas[3] e suas imagens – "da Santíssima Trindade, em madeira, Nossa Senhora dos Remédios e muitas outras de menor importância", segundo o IPAC – foram recolhidas por membros da Irmandade devido ao estado de deterioração da edificação.[4] Os membros da Comunidade da Trindade promoveram pequenos restauros no local e, no altar, incluíram adornos, imagens e elementos religiosos das diversas crenças presentes em Salvador.[4]
Localiza-se num terraplano na aba da encosta que divide a Cidade Alta da Cidade Baixa.[4][3] No entorno da igreja há um sítio onde existem 20 casas, algumas das quais podem ser alugadas ou disponibilizadas para os membros da Comunidade da Trindade.[4]
A Comunidade da Trindade
A Comunidade da Trindade é um grupo da sociedade civil organizada que presta atendimento à população de rua do Centro Histórico de Salvador.[4] Fundada pelo monge católico Henrique Peregrino, recusa o rótulo de organização não governamental, considerando que sua filosofia e ação se diferenciam do enquadramento das ONGs.[4] Participam da Comunidade da Trindade 45 moradores fixos, além de um quantitativo de 50 a 60 pessoas em situação de rua que participam dos cultos ecumênicos e banquetes realizados às quintas-feiras.[4] O alimento é preparado pelos moradores, as refeições são feitas em grupo e a manutenção e a limpeza dos ambientes de convivência é compartilhada.[4] Embora atenda, em sua maioria, adultos, a Comunidade da Trindade mantém um projeto voltado especificamente para o atendimento de jovens.[4] Este projeto conta com uma equipe formada por sete educadores e dois terapeutas, atendendo em média 50 a 60 pessoas por dia, realizando um total de 1.200 atendimentos por mês.[4]
A Comunidade visa à superação da situação de rua de seus membros através da adoção de um programa de cinco passos.[4] O primeiro passo é o do alimento: trata-se de saciar a fome, alimentar, compartilhar a refeição e participar no preparo das mesmas, pondo fim à mendicância por comida.[4] O segundo passo diz respeito ao acolhimento dos recém chegados, independente de sua situação – estes poderão ser hóspedes ou membros da Comunidade.[4] O terceiro passo é o cuidar: investir tempo na regularização da documentação civil do morador de rua e/ou no restabelecimento de sua saúde.[4] O quarto passo compreende a conquista do sustento via geração de renda: os membros da Comunidade produzem arte sacra e cultivam flores e frutos para a venda, fazem a coleta de papelão para a reciclagem e vendem o jornal Aurora da Rua, produzido por eles mesmos.[4] Há também casos em que eles se inserem no mercado formal de trabalho através de convênios da Comunidade com empresas privadas.[4] O quinto e último passo é o da moradia e representa a ruptura com a situação de rua.[4]