Iacube nasceu em 840 numa pequena cidade chamada Carnim (Karnin), que estava localizada a leste de Zaranje e oeste de Boste, no atual Afeganistão. Sua origens eram humildes, porém historiadores posteriores tentaram elevar seu pai Alaite à posição de chefe da guilda de caldeireiros do Sistão,[3] bem como traçaram uma origem lendária a sua família, alegando que descendiam dos reis míticos da Pérsia através da dinastia sassânida.[4] Se sabe que era irmão de Anre, Tair e Ali.[5]Bosworth explica que algumas fontes sunitas foram-lhe hostis devido ao desrespeito que mostrou ao califa abássida mais tarde.[6] "Algumas fontes acusaram-o de ser um carijita, ibne Calicane rotulou-o como cristão, e Nizã Almulque alegou que converteu-se ao ismaelismo".[7] Porém, tais alegações surgiram um século após sua morte, e muitas fontes concordam sobre a vida ascética de Iacube.[8]
Ascensão ao poder
Iacube iniciou sua carreira trabalhando como caldeireiro (alçafar), enquanto seu irmão Anre trabalhou como locatário de mulas. Ele e seus irmãos mais tarde uniram-se aos bandos aiares, grupos paramilitares sunitas que serviram como vigilantes anti-carijitas, liderados por Sale ibne Nácer, que havia se oposto aos abássidas e começou a governar autonomamente em Boste. Cerca de 854, os aiares conseguira expulsar Ibraim ibne Aludaim, que era o governador taírida do Sistão. Em 858, Dirrã ibne Nácer, outro líder aiar, conseguir substituir Sale como governante do Sistão, porém, em 10 de abril 861, Iacube derrubou-o e nomeou-se como emir.[4][5]
Campanhas no Sistão e Coração
Iacube atraiu a atenção do califa Almostaim(r. 862–864) por sua luta contra os carijitas no Sistão. Em 864, "Iacube liderou uma expedição em Boste contra seu antigo mestre Sale, e então em Rucaje e Zamindavar contra o governante local, o zumbil, matando-o e assegurando imenso butim."[4] Ele também conseguiu capturar vários membros dos zumbiles, incluindo o filho do rei. Ele mais tarde moveu-se contra os carijitas no norte do Sistão, ganhando uma vitória decisiva e matando seu líder Amar ibne Iácer em 865. As campanhas de Iacube marcaram o declínio do militante carijita no Oriente. Após ter derrotado Amar, Iacube celebrou. Durante a celebração, um dos membros da corte fizeram um discurso em árabe. Iacube solicitou a carta, pois ele havia feito discurso numa língua na qual não podia entender. Um de seus secretários, Maomé ibne Uacife, então fez um cácida em persa.[9]
Iacube reclamou a herança dos reis da Pérsia e procurou "reviver a glória deles," e assim em 867 enviou um poema escrito por ele ao califa Almutaz(r. 866–869). O poema dizia: "comigo está o Derafsh Kaviani, através do qual espero governar as nações."[10] Em 870/871, Iacube marchou contra os carijitas de Herate, e derrotou-os. Ele então marchou em direção a Cucuque, e derrotou outro líder carijita chamado Abderramão. Iacube então perdoou Abderramão e o fez governador de Isfizar.[11]
Seu exército mais tarde marchou para Gásni, Cabul e Bamiã, conquistando-os em nome do islã e nomeando governadores. De lá, moveram-se ao norte do Indocuche e cerca de 870 o Coração inteiro estava sob seu controle. O vale de Panjexir estava agora sob controle de Iacube, o que tornou-se capaz de cunhar moedas de prata.[12] Em 873, Iacube expulsou os taíridas de seu capital Nixapur e capturou seu governante Maomé ibne Tair, que liderou os conflitos com o Califado Abássida. Durante uma das várias batalhas de Iacube, sua face foi desfigurada de modo que só pode comer através de um cano em sua boca por 20 dias.[13]
Campanhas no Irã Ocidental
Iacube partiu para o oeste de Pérsis com a intenção de subjugar a província. As fontes desacordam sobre o que aconteceu, mas Iacube foi posteriormente dissuadido de continuar sua expedição, e virou-se em direção ao Sistão. Sua retirada é descrita como tendo sido causada pela submissão e ele do governador Maomé ibne Uacil, ou pela chegada de emissários enviados pelo governo califal para convencê-lo a abandonar seu avanço. De todo modo, Maomé logo em seguida reaproximou-se do governo central, e em 872 ele entregou o caraje (receita tributária), e possivelmente o governo de Pérsis, ao representante califal.[14][15][16] Mais tarde, em 874, Iacube marchou contra o Tabaristão e ameaçou o emir zaiditaHaçane ibne Zaíde(r. 864–884), pois abrigava um de seus inimigos, Abedalá Sijzi. Em seu caminho passou por Asfaraim e seus territórios, onde encontrou-se com Badil Alcaxi, um indivíduo conhecido por coletar tradições proféticas e por praticar trabalhos supererrogatórios. No encontro, Iacube colocou grilhões em Badil e levou-o ao Tabaristão. Ao chegar próximo de Sari, a capital provincial, exigiu que Haçane entregasse Abedalá, o que ele se recusou, obrigando Iacube a informá-lo de sua intenção de atacar.[17]
Os exércitos se encontraram em combate e Haçane foi forçado a fugir para Alxirriz, nas montanhas de Dailão. Iacube ocupou Sari e marchou para Amul, onde coletou dos habitantes os impostos anuais. De Amul, marchou contra Alxirriz em perseguição a Haçane. Ao aproximar-se das montanhas do Tabaristão, foi surpreendido por um ininterrupto período de chuva que, segundo Atabari, durou 40 dias, o que dificultou seu avanço. Devido a grandes baixas sofridas, Iacube decidiu abandonar sua missão e retornar às fronteiras do Tabaristão;[18][19] Atabari relata que ele perdeu 40 000 homens e boa parte de seus cavalos, camelos e bagagem.[20]
Iacube novamente marchou em direção a Pérsis, mas desta vez invadiu a província e avançou para Estacar, tomando os tesouros de Maomé lá. Maomé partiu do Cuzestão e retornou para Pérsis numa tentativa de impedi-lo. Eles se encontraram próximo do lago Bachtegã em agosto de 875, e na batalha resultante, Maomé, apesar de ter um exército numericamente superior, foi derrotado. Maomé foi forçado a fugir; Iacube saqueou a fortaleza de Maomé em Saidabade e tomou controle de Pérsis.[21][22][23]
Em 876, o regente abássida Almuafaque ofereceu a Iacube o governo do Coração, Tabaristão, Pérsis, Gurgã e Rei, bem como nomeou-o chefe da segurança em Baguedade;[24][25][26]ibne Calicane acrescentou Carmânia, Azerbaijão, Gasvim e Sinde.[27] Iacube, sentindo que a oferta foi feita devido a fraqueza do califa, rejeitou-a e escreveu-lhe informando que avançaria contra a capital. A oferta também alienou os turcos em Samarra, que sentiam que Iacube representava uma ameaça aos seus interesses. Vendo que um acordo era impossível, Almutâmide declarou guerra e pronunciou uma maldição formal contra Iacube. Em 7 de março de 876, ele deixou Samarra, deixando seu filho Almufauade no comando da capital. Em 15 de março, chegou em Baguedade, antes de chegar perto de Caluada e montar acampamento. De lá seu exército marchou para Sibe Bani Cuma, onde o general de Almutâmide, Almançor de Bactro, uniu-se a ele depois de atrasar o exército de Iacube. Enquanto esteve lá, o califa reuniu mais tropas para seu lado.[28][29][30][31]
De sua parte, Iacube viajou através do Cuzistão, período no qual um antigo general califal, Abil Saje Deudade, desertou e entrou no Iraque. O general califal Almançor conseguiu atrasar seu progresso ao inundar as terras fora de Uacite, mas o exército safárida foi capaz de através e entrar em Uacite em 24 de março. Deixando Uacite, dirigiu-se à cidade de Sair Alacul, que estava a cerca de 50 milhas de Baguedade.[30][29][32][33] De acordo com uma fonte, Iacube não esperava realmente que o califa fosse oferecer batalha; em vez disso ele cederia a qualquer uma das exigências que o safárida tivesse.[34][35] Almutâmide, contudo, enviou Almuafaque para impedi-lo. Os dois exércitos encontraram-se em Istarbande, entre Dair Alacul e Sibe Bani Cuma.[36][37][38][39]
A batalha ocorreu em 1,[37] 8[40] ou 10 de abril.[41] Antes da batalha, Iacube relevou suas tropas, que incluíam 10 000 homens. Os abássidas, contudo, tinham superioridade numérica e a vantagem adicional de lutarem em terreno familiar.[42] O centro do exército abássida foi comandado por Almuafaque. Muça ibne Buga comandou a ala direita e Almançor a esquerda.[40][41][43] Um apelo final foi feito aos safáridas para que restaurassem sua lealdade ao califa, e a batalha começou.[44][45] Ela ocorreu durante a maior parte do dia. O exército safárida estava relutante para lutar diretamente contra o califa e seu exército. Apesar disso, houve várias baixas em ambos os lados, e vários comandantes abássidas e safáridas foram mortos. Iacube foi ferido, mas não deixou o campo. Com a aproximação da noite, reforços chegaram para apoiar Almuafaque.[41][46][47][48]
O maula Noçáir criou uma distração ao atacar a retaguarda safárida a partir de barcos no Tigre e atear fogo no trem de bagagem inimigo, dando aos abássidas mais vantagem.[49][50] Posteriormente, o exército safárida começou a fugir. Iacube e seus guardas continuaram a lutar, mas foram forçados a deixar o campo a medida que o exército se retirou, deixando-os para trás.[41][49][50][51][52] O califa aparentemente inundou as terras atrás dos safáridas antes da batalha, e isso tornou a retirada difícil; muitos se afogaram tentando escapar do exército abássida.[40][38] Com os safáridas fazendo uma retirada apreçada, Almuafaque foi capaz de capturar a bagagem de Iacube. Vários prisioneiros políticos que Iacube trouxe consigo, como o taírida Maomé ibne Tair, também caíram nas mãos dos abássidas e foram libertados.[41][49][50][51][52]
Morte
Iacube contraiu um quadro de cólica e se recusou a tratar quando aconselhado. Como resultado, faleceu numa quarta-feira, 5 de junho de 879, em Bendosabora.[4] Ele foi logo depois sucedido por seu irmão Anre(r. 879–901).[53][54] Embora nunca tenha sido visto como cavalheiro, também não exerceu nenhuma crueldade especial. Relata-se que não sorria muito, e foi chamado "o Bigorna" por um de seus inimigos. Segundo ibne Calicane, sua esposa foi uma árabe do Sistão, embora todas as fontes, incluindo ibne Alatir e Juzjani, alegam que Iacube nunca casou.[55][56]
Legado
A motivação por trás das campanhas iniciais safáridas permanece obscura e amplamente debatida pelos estudiosos. Alguns acreditam que Iacube lutou como um guerreiro gazi com o objetivo de espalhar o islamismo proto-sunita,[57] outros apoiam a noção de que foi motivado por sua identidade persa e consequente desejo de restaurar o passado sassânida, enquanto outros acreditam que foi motivado simplesmente por ganância e adrenalina. A hostilidade de Iacube para com os califas foi facilmente vista. Segundo a História do Sistão, ele teria dito que os abássidas eram mentirosos, bem como disse o seguinte: "Vocês não viram o que eles fizeram com Abu Salama, Abu Muslim, a família barmécida e Alfadle ibne Sal, apesar de tudo o que esses homens fizeram em nome da dinastia? Que ninguém confie nele!".[58]
Foi durante o reinado de Iacube que o persa foi introduzido como língua oficial,[59] e Iacube relatadamente não sabia árabe.[9] A Iacube foi concedido um estatuto histórico de herói popular uma vez que sua corte começou a revitalizar o persa após dois séculos nos quais o árabe floresceu em territórios persas.[2] Vários poetas como Abu Ixaque Ibraim ibne Manxade, fabricaram a genealogia de Iacube, alegando que descendia do lendário rei iraniano Janxide.[60] Iacube é também às vezes considerado como um dos primeiros governantes autônomos no Coração desde as conquistas islâmicas.[1][2] as campanhas de Iacube de fato também marcaram o estágio inicial do declínio da unidade política califal no mundo islâmico.[4]
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