Se consagrou no time inglês do Manchester United, sendo considerado um dos maiores ídolos do United de todos os tempos e o melhor jogador irlandês e britânico da história.[1][2][3] Seu talento foi reconhecido além da Europa; o jornalista e técnico brasileiro João Saldanha, indagado em 1981 para escalar seu time dos sonhos, colocou Best entre os titulares[4] e a Revista Placar descreveu-o em 1970 como "um jogador brasileiro nascido na Irlanda do Norte".[5]
O significado de seu sobrenome, em inglês, é "melhor",[6] o que gerou um ditado popular em sua terra natal: "Maradona good. Pelé better. George Best (Maradona, bom. Pelé, melhor. George, 'O' melhor)".
Início
Nasceu na capital da Irlanda do Norte, logo após o fim da Segunda Guerra Mundial. Era tão fanático por futebol quando criança que dormia com uma bola na cama.[3] Aos 15 anos, foi treinar no Manchester United, descoberto por um olheiro do clube que o vira atuar por um time amador de Belfast, os Cregagh Boys. Em 1963, aos 17 anos, estreou como profissional. Era magro e franzino, mas demonstrava grande velocidade e domínio de bola.[7] O clube ainda vivia no luto causado pela morte, em acidente aéreo, de alguns integrantes da jovem e brilhante equipe que encantara o futebol inglês nos anos 1950, os Busby Babies,[8] os "bebês" do técnico Matt Busby, um dos sobreviventes do desastre.
Tendo continuado no comando do time, Busby aprovaria a contratação do gênio anunciado.[8] Em sua primeira temporada, Best participou do título da FA Cup.
Estrelato
Não demoraria a explodir: driblador, provocador e dono de um talento irrepreensível dentro de campo[1] (o que lhe rendeu comparações a Garrincha),[3][6] formou um lendário trio com o inglêsBobby Charlton e o escocêsDenis Law. Com eles, foi campeão inglês em 1965, o sexto título da história do clube no campeonato. Credenciado para a Copa dos Campeões da UEFA de 1966, o United cruzou nas quartas-de-final com o forte Benfica de Eusébio, Coluna e José Torres, clube cuja equipe-base fora bicampeã do torneio em 1961 e 1962.
Após vitória apertada por 3–2 em Old Trafford, Busby determinou cautela e estudo do adversário nos primeiros quinze minutos da partida de volta, em Lisboa. Best o desobedeceu e em doze minutos já havia marcado duas vezes.[1] Os Red Devils fariam 5–1 (com ele marcando um terceiro gol) em pleno Estádio da Luz. No dia seguinte, ele era manchete nos jornais ingleses com o título mais cultuável possível pela juventude inglesa daqueles tempos: "O Quinto Beatle".[8] O sonho do troféu europeu naquela temporada, entretanto, acabaria nas semifinais, onde os mancunianos foram eliminados pelos iugoslavos do Partizan.
O apelido ganhou força de qualquer forma, e também devido à vida de Best fora de campo, onde era frequentemente visto com belas mulheres e carros de último tipo,[6] despertava histeria nas adolescentes com seus cabelos longos e esvoaçantes[8] e seu rosto de galã de cinema,[3] metendo-se em altas festas. Tal comportamento boêmio o levaria ao alcoolismo que acabaria com a sua carreira. Com certa frequência, também atrasava-se ou não comparecia a treinos, o que o fez levar inúmeras multas e suspensões.[2]
Ainda assim, sua capacidade devastadora de furar defesas e seu grande carisma[2] esgotavam a imaginação da imprensa europeia, que a cada nova grande exibição procurava um novo adjetivo para qualificá-lo.[6] Após voltar de uma de suas suspensões, que durou 28 dias, marcou os seis gols da vitória por 8–2 sobre o Northampton Town.[6]
Em 1967, veio novo título inglês. O tri quase veio em 1968: Best terminou o campeonato como artilheiro com 28 gols, mas a conquista ficou com o rival Manchester City por dois pontos de diferença. Paralelamente, em nova chance na Copa dos Campeões, o United encarou outra vez o Benfica, desta vez na final, disputada no mítico Wembley. Best marcou o terceiro gol na vitória por 4–1 driblando toda a defesa adversária, fazendo do United o primeiro inglês a vencer o mais importante troféu europeu de clubes.
Ao final daquela arrasadora temporada, recebeu a Bola de Ouro da France Football como o melhor jogador europeu do ano. É até hoje o único de todos os irlandeses agraciado com o prêmio. No clube que aprendeu a amar, marcaria 179 gols em 470 jogos, tendo sido artilheiro do time em seis temporadas seguidas.
Decadência
Cada vez mais explorado nas colunas sociais, seu rendimento em campo começou a cair justamente logo após o auge de sua consagração. O United chegou a passar cinco anos sem assumir a liderança do campeonato inglês, até consegui-la temporariamente na temporada 1971-72.[9] Nesse período, perdeu o Mundial Interclubes de 1968 para o Estudiantes de La Plata (Best chegou a ser expulso no jogo de volta, em Old Trafford[10] - os argentinos haviam vencido em casa e empataram fora), não conseguia mais troféus. Matt Busby, um dos poucos no clube a aturar o temperamento de Best,[1] aposentaria-se de vez em 1971, após ter chegado a deixar o cargo em 1969. Não ajudavam as aparições de Best bêbado nos tablóides ingleses.[3] Tinha a vida cada vez mais questionada em cada detalhe pela mídia, que o tratava como celebridade tal como a um músico ou um diplomata.[6] "Eu sou o cara que levou o futebol das páginas internas para a capa dos jornais", teria dito.[8]
Em 1972, declarou-se aposentado do futebol, mas voltou ao United na seguinte pré-temporada, até deixar o clube de vez em 1973,[11] no meio da campanha desastrosa que culminaria no rebaixamento do clube, decretado em derrota para os rivais do City. De início, havia declarado naquele mesmo mês que encerraria a carreira.[12] "Estou sem jogar há oito meses, mas não deixaria de vir à festa do Eusébio", afirmou no fim de setembro daquele ano na ocasião do amistoso em que o craque português se despediu festivamente do Benfica contra um combinado internacional.[13]Alfredo Di Stéfano, em entrevista naquela época à Placar, relatou ao repórter sobre Best, que encontrava-se no mesmo recinto, que "vou apresenta-lo, mas não sei inglês e não posso servir de intérprete. Depois, nem sei se ele vai querer falar, é um louco".[14]
Ficou um tempo emprestado ao insignifcante Dunstable Town. No ano seguinte, foi para o não muito maior Stockport County. Na época, convivia com ameaças dos terroristas do IRA por ser protestante. Sua irmã chegou a levar um tiro na perna em um atentado.[2] Curiosamente, do Stockport iria para uma equipe católica, o Cork Celtic, da própria República da Irlanda. Jogaria em outro clube alinhado a católicos posteriormente, o Hibernian, da Escócia.
Best chegou a reaparecer na elite inglesa ao passar uma temporada no Fulham, onde atuou ao lado de Bobby Moore. Mas resolveu esconder-se no futebol dos Estados Unidos, à procura de abafar sua decadência.[2] O Fulham chegou a acionar a FIFA para puni-lo, acusando-o de ter se transferido ilegalmente para os EUA. A entidade anistiou o norte-irlandês. Se na América do Norte ele, que estaria há quatro meses sem consumir álcool, chegou a jogar ao lado de Gerd Müller e Teófilo Cubillas no Fort Lauderdale Strikers,[15] jogou também no time da Prisão Ford, onde ficou preso por oito semanas por dirigir embriagado e bater em um policial.[3]
Em 1979, já passava anos não durando mais de uma temporada nas equipes que lhe empregavam. Fez fé pública de sua recuperação como atleta e como pessoa, oferecendo seus serviços a qualquer equipe, disposto a contratos de risco.[16] Iria ao Southend United, da terceira divisão inglesa, mas não foi liberado pelo Fulham, que ainda era o dono do passe de Best.[17] Conseguiu então ir ao Hibernian, na época o último colocado do campeonato escocês. Best aceitou com a contrapartida de que, se despertasse interesse de algum clube inglês, fosse imediatamente liberado.[16] Mas os problemas com o alcoolismo persistiram e fariam-no ser expulso do time em 1980.[18] Após a dispensa, internou-se imediatamente em uma clínica de reabilitação,[7] Angela MacDonald-James, sua esposa, afirmou na época que "tínhamos decidido formar uma família. Mas com tudo isso, não quero correr o risco. Não creio que isso seria bom, tendo em vista o estado de George".[19]
Meses depois, nasceu seu filho Callum e Best, em meados de 1981, quando chegou a estar sete meses afastado do vício, garantia que havia mudado após o nascimento do filho. "Encontrei muita gente na minha carreira, mas ninguém me ajudou. Os clubes tratam com máquinas, não com jogadores: não há ninguém com quem desabafar e discutir problemas. Houvesse uma única pessoa, eu não me tornaria um alcóolatra", defendeu-se na época.[20] Nesta época, o Manchester United cogitou recontrata-lo, como o então técnico Ron Atksinson declarando-se pronto para esta experiência.[21] Mas, revoltado com a seriedade de seu tratamento com o alcoolismo ser posta em dúvida por torcedores do United, Best abandonou as negociações: "não vou expor meu cartaz nessa porcaria de time. Volto para os Estados Unidos", declarou.[22] Em meados de 1983, a justiça de Londres anunciou o embargo financeiro do jogador, em razão de dívidas com lojas comerciais, bares e credores individuais, em montante que somava 178 mil dólares. Na época, seu contrato com o Bournemouth, da quarta divisão inglesa, era rescindido pelo clube. "A bebida e os automóveis me fizeram perder tudo", admitiu Best naquele momento.[23]
Aos 38 anos, em 1984, se aposentou definitivamente, já não sendo nem sombra do craque espetacular dos anos 1960 e início dos anos 1970.[2]
Pela seleção
Best está, certamente, entre os grandes jogadores da história do futebol a jamais ter jogado uma Copa do Mundo. A estreia pela Seleção Norte-Irlandesa ocorreu em 1964, em amistoso contra o País de Gales (na partida, estreou também outra futura grande estrela da seleção, o goleiro Pat Jennings), e a equipe - que estreara em Copas no mundial de 1958 e esteve ausente no de 1962 - esteve bem próxima de classificar-se para a Copa de 1966, sediada na Inglaterra, onde morava. Um empate fatal fora de casa na última rodada das Eliminatórias contra a inexpressiva Albânia eliminou o selecionado, que ficou um ponto atrás - com maior saldo de gols - do que a primeira colocada, a Suíça. O empate foi justamente o primeiro ponto conquistado pelos albaneses naquelas Eliminatórias, em que terminaram na última colocação de seu grupo. Os norte-irlandeses, por ironia, haviam sido a única equipe do grupo que havia conseguido golear a Albânia (na partida em Belfast), caracterizada pela tática defensiva que a fazia levar poucos gols.[24]
A Irlanda do Norte disputou vaga na Copa de 1970 contra Turquia e União Soviética. Nos dois primeiros jogos, obteve duas vitórias contra os turcos. Após um recesso de dez meses nas disputas, entretanto, perdeu o embalo e ficaria em segundo lugar no grupo - e sendo assim eliminada - após empatar em casa contra a URSS e perder fora.[25] Àquela altura, quando ainda jogava em plena forma, Best lamentou-se: "pela primeira vez em minha vida eu desejaria realmente ser inglês pelo menos durante um mês", em alusão ao fato de que a seleção inglesa estava garantida no mundial e que Best era visto no momento como hipotético titular absoluto nela caso fosse inglês.[6]
Com Best já decadente, o país ficou em terceiro lugar, atrás dos classificados búlgaros e dos portugueses nas Eliminatórias para o mundial de 1974.[26] Ele inicialmente parou de ser convocado após 1973, retornando em 1976,[27] quando havia voltado a jogar a elite inglesa, pelo Fulham. Na última oportunidade de Best em disputar uma Copa, a de 1978, a seleção ficou novamente em terceiro lugar nas Eliminatórias, atrás dos Países Baixos e da Bélgica.[28] Best fez sua última partida pela Irlanda do Norte em 1977,[29] por aquelas eliminatórias, na derrota de 0-1 para os Países Baixos em 12 de outubro.[27]
Ironicamente, na primeira tentativa de classificação para uma Copa sem contar com Best, os norte-irlandeses conseguiram vaga para a de 1982. Houve quem defendesse a sua convocação para o mundial da Espanha,[30] quando à época estava no San Jose Earthquakes. Best estava com 36 anos e escondido na liga estadunidense, mas ainda era respeitado na terra natal. O técnico Billy Bingham procurou ver Best, mas uma fraca partida da equipe o fez optar por não levar o decadente astro.[31] Best declararia que ficaria resignado em ser utilizado em poucos minutos, apenas para sentir a sensação de disputar uma Copa, mas respeitou a decisão de Bingham.[31]
Ao todo, foram apenas 37 partidas por sua nação.[29] Sempre lamentou não ter realizado mais jogos; seus compromissos com o United o impediram de conciliar o clube com a seleção com certa frequência.[31] Marcou nove vezes.[29] Teriam sido dez se um gol, seu mais famoso, não tivesse sido anulado por um bandeirinha. Em amistoso contra a Seleção Inglesa em 1971, em Belfast, tirou a bola do domínio de Gordon Banks, aproveitando-se de um momento de desatenção do lendário goleiro inglês, que jogara a bola no ar para chutá-la. Best cabeceou-a para o gol, e o árbitro auxiliar considerou o lance faltoso. O norte-irlandês também atuou por uma seleção de estrangeiros, dentre os quais Pelé, Bobby Moore e Giorgio Chinaglia, que representou os Estados Unidos no Torneio Bicentenário do país, em 1976.[32]
Casado duas vezes e tendo quatro filhos, dois dos quais não reconheceu como dele,[8] deu em 1990 um vexame em debate ao vivo pela BBC, completamente bêbado[8] ("Eu o vi se aproximar e os olhos dele estavam vermelhos. Sabia que ele tinha tomado várias em menos de cinco minutos", disse o apresentador do programa, Terry Wogan[33]). Em 2002, teve de receber um transplante de fígado, destruído pela cirrose, voltando a beber logo no ano seguinte.[3] No dia 3 de outubro de 2005, foi internado às pressas no hospital Cromwell de Londres com problemas nos rins.[3]
Seus últimos dias foram no hospital, ao lado de sua família e do amigo Denis Law. Aos pés da cama, uma carta com a seguinte assinatura: "Do segundo melhor jogador de todos os tempos, Pelé".[8] Sobre ela, Best disparou: "Este foi o último brinde da minha vida".[8]
No dia 20 de novembro, teve seu último gesto de nobreza: deixou-se fotografar no seu estado lamentável no quarto do hospital onde estava pela imprensa, com a mensagem: "Não morra como eu".[8] Morreria cinco dias depois, com múltipla falência dos órgãos. Homenageado por multidões e políticos como grande estrela, foi enterrado com 59 anos ao lado de sua mãe na sua cidade natal, Belfast.[3]
George Best é considerado um héroi nacional em sua terra natal, a Irlanda do Norte. O cortejo de seu funeral foi acompanhado por cerca de 100.000 pessoas. O Aeroporto Internacional de Belfast foi renomeado para George Best Belfast City Airport.
Frases
Além de ter deixado ao mundo seu futebol inesquecível, tornou-se conhecido também por suas e grandes e inesquecíveis frases de efeito.[3]
"Odeio táticas, elas me aborrecem. O que me importa são meus dribles, chego a sonhar com eles".[2]
"(David Beckham) não chuta com a esquerda, não sabe cabecear, não sabe driblar e não marca muitos gols; fora isso, ele é bom".[8]
“Eu sou o cara que levou o futebol das páginas internas para a capa dos jornais”.
"Em 1969, eu abandonei as mulheres e o álcool. Foram os 20 piores minutos da minha vida".[8]
"Gastei muito dinheiro com bebidas, mulheres e carros. O resto eu desperdicei".[8]
"Dizem que tentei dormir com sete Misses Mundo. Não é verdade. Foram apenas quatro. As outras três é que vieram atrás de mim”.
"Se você me fizesse escolher entre passar por quatro jogadores e marcar um gol de trinta jardas contra o Liverpool ou ir para a cama com a Miss Universo, seria uma escolha difícil. Felizmente, eu fiz os dois".[11]
"Se eu tivesse nascido feio, vocês não ouviriam falar de Pelé. Dou-me muito bem com as garotas, gosto de divertir-me, de tirar prazer do dinheiro que ganho e por isso não me dedico inteiramente ao futebol. Eu não serei um monge do futebol apesar de treinar com vontade e de jogar com mais vontade ainda. Sinto que posso fazer o que quiser com a bola, não importa o adversário. Por isso, poderia ser melhor que Pelé, se quisesse".[6]
O jogador também foi citado em uma música da banda irlandesaU2 feita para o filme Em Nome do Pai, que aborda a injusta condenação de um imigrante irlandês na Inglaterra acusado de cometer um ato terrorista do IRA. Em "In the Name of the Father", Bono Vox canta: "In the name of United/and the BBC/In the name of George Best/and LSD". O uso da palavra United pode ser interpretado tanto como referência ao clube em que Best virou símbolo como também ao Reino Unido.
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↑QUADROS, Raul; PIMENTEL, Fernando (5 de outubro de 1973). Festa para um rei negro. Placar n. 186. Editora Abril, pp. 20-22
↑QUADROS, Raul (19 de outubro de 1973). O neto me fez parar. Placar n. 188. Editora Abril, pp. 26-27
↑Com esses três, sai de baixo que o bicho é certo (13 de abril de 1979). Placar n. 468. Editora Abril, p. 33
↑ abO boêmio volta aos gramados (30 de novembro de 1979). Placar n. 501. Editora Abril, p. 82
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↑Bebida arruína craque irlandês (10 de junho de 1983). Placar n. 681. Editora Abril, p. 54
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